O Papa Leão XIV foi eleito como o 267º pontífice, líder da Igreja Católica e guia espiritual de mais de 1,4 bilhão de católicos. Ele é o primeiro papa da história a vir dos Estados Unidos.
Desde o século 19, a influência dos Estados Unidos na Igreja Católica tem aumentado constantemente, refletindo a ascensão geopolítica global do país. Os bispos, as instituições e os doadores dos EUA têm desempenhado um papel cada vez maior na definição da política da igreja, nas nomeações e no envolvimento internacional, sinalizando uma mudança em relação ao tradicional domínio europeu.
Essa influência crescente foi acompanhada por muito tempo por desconforto com a ideia de confiar a liderança da comunidade católica global a uma figura da nação mais poderosa do mundo. Nesse sentido, a eleição de Leão XIV é uma escolha inesperada e significativa.
Robert Francis Prevost, nascido em Chicago em 1955, passou grande parte de sua vida eclesiástica até o momento no Peru, onde se tornou uma figura respeitada na igreja local. Ele foi enviado ao Peru em uma missão depois de fazer seus votos solenes como agostiniano e estudar em Roma.
Uma vez lá, ele serviu por muitos anos como vigário judicial e professor de cânone, patrística (cristãos primitivos) e teologia moral em Trujillo. Em 2014, foi nomeado administrador apostólico de Chiclayo e tornou-se seu bispo em 2015, cargo que ocupou até 2023.
Prevost obteve a cidadania peruana e foi amplamente considerado como uma presença pastoral estabilizadora em uma igreja frequentemente dividida entre a teologia da libertação e o ultra-tradicionalismo. Conhecido por sua humildade e acessibilidade, ele era respeitado por sua capacidade de promover o diálogo entre os diversos episcopados do Peru.
Seu compromisso de longa data com a América Latina ajudou a moldar sua reputação internacional e foi fundamental para sua eventual eleição como o primeiro papa norte-americano da Igreja.
Continuidade ou ruptura com Francisco?
É difícil determinar, neste estágio inicial, se a eleição de Leão XIV marcará uma continuação do pontificado do Papa Francisco ou um claro afastamento dele. O mais provável é que ela represente algo como um meio termo.
A primeira imagem do papa recém-eleito – aparecendo na sacada com as tradicionais vestes papais brancas e vermelhas, adornadas com uma cruz de ouro – foi impressionante. Ela ecoou a aparência de Bento XVI em 2005, em contraste com a escolha mais austera de Francisco de uma batina branca simples e uma cruz de prata, o que refletiu um gesto deliberado de humildade.
No entanto, o forte foco de Leão XIV nos pobres – enraizado em seus anos como missionário no Peru – e sua calorosa saudação à comunidade peruana, uma das periferias globais da Igreja, sugerem uma clara linha de continuidade com as prioridades pastorais de Francisco.
Até mesmo a escolha de seu nome evoca Leão XIII, papa de 1878 a 1903 e autor da Rerum Novarum, a encíclica de referência sobre justiça social e os direitos dos pobres. Leão XIV pode, portanto, encarnar um papado que mantém um compromisso firme com os marginalizados, ao mesmo tempo em que adota um estilo menos conflituoso e mais comedido do que o de seu antecessor reformista, que às vezes adotava abertamente posições anticulturais.
Um contrapeso para Trump?
Antes de se tornar papa, Prevost, em várias ocasiões, criticou abertamente o atual governo dos EUA – especialmente em questões de política migratória. Como cardeal, ele expressou preocupação com as declarações feitas pelo vice-presidente dos EUA, J.D. Vance, que se converteu ao catolicismo em 2019.
Ele compartilhou um artigo desafiando a interpretação de Vance sobre o amor cristão em relação à imigração. Prevost também compartilhou postagens criticando Donald Trump e o presidente salvadorenho Nayib Bukele em relação à deportação de Kilmar Abrego Garcia, um salvadorenho que vive em Maryland.
Sob esse prisma, a eleição de um papa americano – antes uma perspectiva vista com desconfiança – poderia agora representar uma das vozes morais mais fortes contra as políticas de migração de linha dura do governo de seu próprio país e um contrapeso à influência de Donald Trump.
A escolha do nome Leo também é potencialmente significativa aqui. O Papa Leão XIII se opôs fortemente ao nacionalismo extremo, vendo-o como uma ameaça à missão universal e à autoridade moral da Igreja.
Embora reconhecesse o valor do patriotismo legítimo, ele sustentava que a lealdade a Deus e à Igreja sempre deve ter precedência sobre a lealdade ao Estado-nação. Em encíclicas como Immortale Dei e Sapientiae Christianae, ele defendeu o caráter supranacional da Igreja e advertiu contra a subordinação da fé aos interesses nacionais.
Para Leão XIII, a verdadeira virtude cívica nunca poderia entrar em conflito com a lei divina, e qualquer forma de nacionalismo que o fizesse corria o risco de se tornar um tipo de idolatria. Em uma era de nacionalismo crescente em todo o mundo, especialmente nos Estados Unidos, conectar-se a essa mensagem seria uma declaração clara e poderosa.
Embora a perspectiva de um papa americano já tenha causado preocupação, a escolha de Leão XIV mostra sensibilidade às margens do mundo. No entanto, em uma Igreja onde o crescimento católico é mais pronunciado na África e na Ásia – enquanto os números continuam a diminuir na Europa e nas Américas – a eleição de outro pontífice ocidental não está isenta de desafios. Algumas regiões ainda podem se sentir negligenciadas ou sub-representadas.
Um gesto promissor foi a decisão de transmitir uma breve mensagem em espanhol da sacada da Basílica de São Pedro – a primeira vez na história papal. Ao mesmo tempo, é surpreendente que o conclave mais diversificado do mundo já convocado tenha colocado a liderança da Igreja nas mãos de um cardeal da nação mais poderosa do mundo. O novo papa precisará unificar uma igreja que está se tornando cada vez mais global e indo além de seu passado eurocêntrico.