As atenções do cenário internacional estão voltadas para as negociações intensas entre Estados Unidos e União Europeia na tentativa de evitar uma escalada na guerra comercial que já ameaça setores inteiros da economia global. O que muitos brasileiros talvez ainda não percebam é que, por mais que pareça uma disputa distante, os acordos (ou fracassos) firmados entre Washington e Bruxelas podem trazer impactos profundos e concretos para o Brasil — do agronegócio à indústria, das exportações ao emprego.
Nas últimas semanas, representantes de alto escalão de ambos os lados buscam evitar o aumento de tarifas e novas medidas retaliatórias sobre produtos estratégicos. Em jogo estão temas como as tarifas sobre aço, alumínio e automóveis, além de questões que envolvem regulações ambientais e digitais, muitas vezes classificadas pelos americanos como “barreiras não-comerciais”. O temor é que, se não houver acordo até o prazo estabelecido, EUA e UE entrem em uma nova fase de retaliações mútuas, elevando o custo do comércio internacional e contaminando fluxos globais.
As negociações são complexas porque envolvem interesses econômicos, considerações políticas e geoestratégicas. Para os Estados Unidos, manter tarifas elevadas é visto como forma de proteger setores industriais tradicionais e ganhar apoio interno. Já a União Europeia, pressionada por setores como o automotivo e o agrícola, busca evitar prejuízos, ao mesmo tempo em que defende regras ambientais e digitais mais rígidas, hoje vistas como referência global.
Para o Brasil, as consequências desse embate podem ser múltiplas e negativas. O país é altamente integrado às cadeias produtivas globais: exporta matérias-primas, insumos industriais, alimentos e bens manufaturados tanto para os EUA quanto para a Europa, além de disputar mercados com ambas em várias partes do mundo (China, Japão, etc.). Se o comércio entre americanos e europeus se torna mais restrito, esses produtos tenderão a ser direcionados para terceiros mercados — frequentemente, os mesmos onde o Brasil busca espaço. O resultado provável é aumento da concorrência e pressão para baixo nos preços.
No caso do aço e do alumínio, por exemplo, a imposição de tarifas adicionais desviaria exportações dos EUA e UE para mercados como o latinoamericano, inundando a região com oferta excedente e reduzindo a competitividade das empresas brasileiras. O mesmo ocorre com automóveis, máquinas e produtos agrícolas. Um impasse entre ambos significa mais dificuldade para o Brasil manter e ampliar sua fatia em mercados-chave.
Outro ponto de atenção para o Brasil está no campo regulatório. Parte importante das negociações gira em torno das exigências ambientais e digitais impostas pela União Europeia. Nos últimos anos, o bloco europeu aprovou legislações cada vez mais rigorosas, exigindo rastreabilidade, sustentabilidade e transparência nas cadeias produtivas. Caso, como parte de um acordo com os EUA, essas exigências sejam flexibilizadas ou adaptadas, o Brasil enfrentaria um cenário de incerteza. Ou pior: ver-se-ia excluído de acordos bilaterais que facilitem o acesso ao mercado europeu, ficando à mercê das normas mais rígidas sem o benefício das concessões concedidas aos americanos.
Se a União Europeia mantiver o endurecimento regulatório e adotar padrões ainda mais altos para compensar os EUA, empresas brasileiras terão que investir mais em adequação e certificações para seguir exportando, o que encarece nossos produtos e reduz nossa competitividade internacional. Surge uma situação de “perde-perde” que exige atenção constante do governo e do setor produtivo brasileiro.
Diante desse cenário, o Brasil precisa adotar uma postura estratégica e proativa. Isso passa, em primeiro lugar, por fortalecer sua diplomacia comercial, buscando manter canais de diálogo abertos tanto com os EUA quanto com a UE, e defendendo seus interesses em fóruns multilaterais como a Organização Mundial do Comércio (OMC). Investir na modernização dos setores exportadores, promovendo inovação, sustentabilidade e qualidade para atender aos padrões internacionais mais exigentes, é fundamental.
O país deve buscar ampliar e diversificar seus acordos comerciais com outras regiões do mundo, reduzindo a dependência de mercados tradicionais e abrindo novas oportunidades para os produtos brasileiros. O acompanhamento atento das negociações entre ambos gigantes econômicos se faz necessário, avaliando com rigor os possíveis efeitos indiretos de cada decisão — e, sempre que possível, antecipando medidas para proteger nossa economia.
Em um mundo altamente conectado e competitivo, observar atentamente as movimentações dos demais atores globais não é opção: é questão de sobrevivência. Contudo, o Brasil não pode apenas assistir — precisa saber agir. Isso é essencial.