As mudanças climáticas são uma realidade concreta e crescente, que já afeta todas as regiões da Terra, de muitas maneiras. Vários países do mundo vivenciam um aumento significativo na frequência e intensidade de eventos extremos, como enchentes, secas prolongadas, ondas de calor e elevação do nível do mar.
No Brasil, recentemente essas manifestações têm sido particularmente graves, ampliando muito as vulnerabilidades socioambientais que já existiam, tanto nos centros urbanos quanto em regiões rurais. São vidas perdidas, danos à saúde, prejuízos em safras agrícolas, comprometimento do abastecimento de água, de energia e danos à infraestrutura.
Diante desse cenário, a adaptação às mudanças do clima que já estão em curso em todo o mundo torna-se mais importante e urgente do que estratégias de mitigação dos seus efeitos, especialmente em países como o Brasil.
Adaptação climática: desafio bem mais complexo
Diferentemente da mitigação, cujos objetivos e indicadores são mais facilmente quantificáveis (como metas de redução de emissões), a adaptação às mudanças climáticas é profundamente contextual, variando conforme as vulnerabilidades locais, as capacidades institucionais, as desigualdades sociais e as condições econômicas.
Adaptar-se ao clima não é apenas construir infraestrutura resiliente, mas transformar modelos de desenvolvimento, fortalecer a governança local, proteger populações marginalizadas e garantir que a informação científica esteja acessível e integrada aos processos decisórios.
A ciência climática tem mostrado que é preciso investir em soluções sistêmicas, planejadas e de longo prazo. Ações pontuais ou reativas como respostas a desastres após sua ocorrência têm se mostrado insuficientes diante da intensificação dos riscos climáticos.
COP no Brasil não trará soluções imediatas
Com a aproximação da COP 30 em novembro no Pará, é natural que surjam expectativas na sociedade civil quanto ao que a conferência pode entregar em termos de avanço na agenda de adaptação. No entanto, é importante equilibrar entusiasmo com realismo: a COP não é um espaço de resolução mágica, mas sim de negociação política e diplomática, de avanços graduais e, muitas vezes, de impasses complexos.
A COP 30 tem potencial para ser um marco histórico, especialmente pelo seu simbolismo: ser sediada em plena Amazônia brasileira é uma oportunidade única de colocar a biodiversidade, os saberes tradicionais, a justiça climática e os direitos das populações vulneráveis no centro do debate global.
Então, o que esperar concretamente da Conferência?
No tocante à adaptação, um dos grandes desafios é dar forma concreta ao Global Goal on Adaptation (GGA), que é um marco do Acordo de Paris voltado à promoção de ações de adaptação mais efetivas, mensuráveis e monitoráveis diante dos impactos climáticos.
Para operacionalizar esse objetivo, foi instituído o UAE–Belém Work Programme, que vem avançando na definição de um conjunto de indicadores capazes de refletir o progresso destas ações de adaptação, em diferentes escalas.
Espera-se que na COP 30 aconteça a aprovação da lista final de até 100 indicadores, abrangendo dimensões globais, nacionais, temáticas e de meios de implementação (como financiamento, capacitação e tecnologia).
O Brasil, como país-sede, assume papel central neste processo e deve atuar de forma proativa e qualificada para assegurar que os indicadores reflitam suas especificidades e prioridades. Ao mesmo tempo, devem atender a critérios como viabilidade e capacidade de implementação.
É essencial a compatibilidade entre os indicadores globais e os instrumentos nacionais de política climática, como a Estratégia Nacional de Adaptação (ENA) e os Planos Setoriais e Temáticos de Adaptação.
Em relação ao financiamento para a adaptação, apesar dos compromissos assumidos em conferências anteriores, os recursos efetivamente disponibilizados ainda são muito inferiores às necessidades dos países em desenvolvimento. É urgente avançar no aumento e na previsibilidade do financiamento climático para ações de adaptação, incluindo o fortalecimento de capacidades institucionais locais.
A COP 30 também deve ser uma vitrine para mostrar experiências locais de adaptação, fortalecendo o protagonismo de estados, municípios, povos indígenas, comunidades tradicionais e organizações da sociedade civil.
Aqui podemos destacar o papel do governo federal com a iniciativa Adaptacidades, coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). O programa tem o propósito é fortalecer a atuação de estados e municípios na agenda de adaptação à mudança do clima, apoiando a elaboração de planos municipais ou regionais de adaptação. Também reforça o compromisso do Brasil com o Federalismo Climático, conforme estabelecido na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), na Resolução nº 3 do Conselho da Federação (2024) e na Lei nº 14.904/2024, que define diretrizes para os planos de adaptação.
Os limites da COP 30
Apesar de seu potencial, é importante reconhecer os limites da COP. Não se deve esperar que a conferência resolva todos os impasses ou que traduza imediatamente os consensos globais em mudanças locais. Ou que o Brasil consiga, ato contínuo à COP 30, superar toda a gama de desigualdades sociais e institucionais históricas que tornam as pessoas mais vulneráveis e que dificultam respostas à altura das ameaças climáticas.
Há limitações estruturais, políticas e financeiras que desafiam a implementação de acordos e declarações assinadas. A COP não substitui o trabalho cotidiano de formulação e execução de políticas nacionais, subnacionais e setoriais. Ela é um catalisador, um espaço de mobilização e pressão, mas não um fim em si mesma.
A ciência tem um papel fundamental na construção de respostas adaptativas eficazes. Estudos recentes apontam para a necessidade de ampliar o acesso a dados climáticos regionalizados, integrar informações de risco aos instrumentos de planejamento e gestão, e valorizar o conhecimento local e tradicional como parte das soluções.
No caso do Brasil, ferramentas como o AdaptaBrasil MCTI, o Portal de Projeções Climáticas do INPE e iniciativas como o AdaptaCidades são exemplos concretos de como avançar na direção certa: com base técnica, participação social e foco territorial.
Importante destacar também que a adaptação não é uma tarefa exclusiva de governos ou especialistas. Ela depende de um novo pacto entre sociedade, setor privado, academia e Estado. A COP 30 pode ser um marco simbólico e estratégico nesse caminho, desde que reconheçamos tanto seu potencial quanto seus limites.
Que a COP 30 seja um passo firme para tomada de ações concretas, e não apenas mais uma parada na longa estrada da diplomacia climática.