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Análise: Acordo do G7 é retrocesso no esforço de coibir a evasão fiscal corporativa e tem impacto para o Brasil

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Análise: Acordo do G7 é retrocesso no esforço de coibir a evasão fiscal corporativa e tem impacto para o Brasil

No dia 28 de junho de 2025, o G7 (grupo das sete maiores economias do mundo) tomou uma decisão que abalou o sistema fiscal internacional: as multinacionais sediadas nos Estados Unidos (e, em parte, no Reino Unido) passaram a ser isentas do complemento do imposto mínimo global de 15%. O novo “acordo”, que foi costurado durante uma tensa reunião no Canadá, representa um grande retrocesso no esforço coletivo para coibir a evasão fiscal corporativa e impacta diretamente nos países em desenvolvimento como o Brasil.

O imposto mínimo global, formalizado em 2021 sob a liderança da OCDE e do G20, foi saudado como um marco na luta contra a erosão das bases tributárias nacionais. Sua lógica era simples: obrigar multinacionais a pagar pelo menos 15% de imposto sobre o lucro global, independentemente de onde estejam sediadas, dificultando a transferência artificial de lucros para paraísos fiscais. Mais de 130 países, incluindo o Brasil, concordaram em alinhar suas legislações à proposta — criando, pela primeira vez, um piso global para a tributação empresarial.

Com a volta de Donald Trump à presidência dos EUA, a Casa Branca deixou claro que considerava o imposto mínimo global um ataque à soberania fiscal americana e uma ameaça à competitividade de suas empresas. Trump, junto com o secretário do Tesouro Scott Bessent, ameaçou retaliações: caso outros países aplicassem o complemento tributário (o chamado “top-up tax” sobre as subsidiárias de multinacionais americanas, os EUA responderiam com a chamada “Section 899”, prevendo pesados impostos de retaliação contra empresas europeias e canadenses que atuam nos Estados Unidos.

Jogo duro e ameaças reais

Essa ameaça não era blefe. O governo americano estava disposto a acionar tarifas, taxas e barreiras administrativas para proteger suas multinacionais. O temor de uma guerra fiscal levou ministros de finanças europeus e canadenses a recuarem.

Os EUA jogaram duro. Ao condicionar sua permanência no acordo à aceitação de uma regra especial para suas multinacionais, fizeram uso de sua posição dominante na economia mundial e de seu poder de retaliação comercial. O mecanismo acordado foi o chamado “side-by-side”: multinacionais americanas seriam tributadas apenas de acordo com o sistema doméstico dos EUA o regime GILTI, mesmo quando operassem no exterior. Com isso, escapam do complemento até atingir os 15% em outros países.

O secretário do Tesouro dos EUA, contudo, chegou a pedir ao Congresso que revogasse a Section 899, mas o dano já estava feito: os EUA conseguiram consolidar uma exceção para suas empresas, e os demais países do G7 se comprometeram a defender essa posição também nas negociações da OCDE e do G20. Segundo estimativas do próprio governo americano, a economia para as multinacionais pode superar US$ 100 bilhões em dez anos.

O impacto para o Brasil é duplo: direto e simbólico. Na prática, o país perde a capacidade de tributar integralmente os lucros de grandes multinacionais americanas atuantes no território nacional, privando o Estado de receitas importantes para saúde, educação e infraestrutura. As empresas brasileiras, por outro lado, seguem submetidas a toda a legislação tributária local e global, o que acirra a desigualdade competitiva.

Redução de soberania

Trata-se de uma clara discriminação fiscal baseada na nacionalidade da empresa, afrontando o princípio de tratamento igualitário consagrado pela OMC (art. III) e pela própria OCDE (art. 24). O precedente é perigoso: se os EUA conseguem uma exceção, outros países poderosos também podem reivindicar regras diferenciadas no futuro, esvaziando a essência do acordo global.

O episódio ainda limita a soberania tributária do Brasil, que vê sua autonomia reduzida em prol de interesses de potências estrangeiras. O poder de barganha dos EUA, ao usar ameaças de retaliação e sua influência sobre o G7, deixou evidente a fragilidade dos países em desenvolvimento nesse cenário.

O que era para ser um avanço histórico em justiça tributária global se converteu, em parte, em um privilégio negociado pelas maiores potências. Para o Brasil, o acordo do G7 de junho de 2025 significa menos arrecadação, mais desigualdade e menor autonomia fiscal. Resta ao país, agora, buscar articulação com outros emergentes dentro da OCDE e da OMC para tentar mitigar os efeitos desse novo desequilíbrio e defender seus interesses em futuros pactos internacionais.

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