Após muitas discussões ao longo de vários meses, o presidente Donald Trump anunciou em 9 de julho de 2025 que planejava impor uma tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras para os Estados Unidos. Embora as autoridades brasileiras, juntamente com os líderes da maioria dos outros países, estivessem esperando novas tarifas, dada a sua centralidade na agenda econômica de Trump, o anúncio aparentemente pegou as autoridades brasileiras de surpresa, já que as negociações comerciais entre as duas nações ainda estavam em andamento.
O presidente do Brasil, Lula da Silva, foi rápido em reagir, afirmando que seu país poderia responder da mesma forma, se as tarifas realmente entrassem em vigor em 1º de agosto.
Tem havido muita especulação sobre as razões por trás da decisão e do momento escolhido por Trump, com alguns observadores notando a proximidade com a recente reunião dos países do BRICS, um grupo de economias emergentes, incluindo o Brasil, que já havia despertado a ira de Trump. Outros argumentaram que essa era uma medida protetora para defender indústrias-chave dos EUA, como a siderúrgica, que vem enfrentando dificuldades contínuas contra produtos mais baratos do Brasil.
A resposta mais clara, no entanto, veio do próprio Trump.
Em uma carta a Lula, o presidente dos EUA indicou que sua principal queixa contra o Brasil é, na verdade, o julgamento que o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro enfrenta perante a mais alta corte do país. O ex-líder de extrema direita é acusado de se recusar a reconhecer o resultado da última eleição presidencial em outubro de 2022 e de supostamente ter liderado uma tentativa de golpe contra as instituições democráticas e o Estado de Direito em janeiro de 2023. Se condenados, Bolsonaro e alguns de seus colaboradores mais próximos podem pegar longas penas de prisão.
Um histórico de interferência
A única justificativa econômica mencionada na carta de Trump, a de um déficit que seu país teria com o Brasil, é desmentida pelos números. Os EUA têm mantido superávits consistentes no comércio com o país sul-americano há quase duas décadas.
E Steve Bannon, ex-assessor de Trump, torcedor ativo e principal canal entre a campanha de Trump e Bolsonaro, foi ainda mais direto do que o presidente dos EUA. Em entrevista a um dos principais sites de notícias do Brasil, ele afirmou: “Pare o julgamento e nós reverteremos as tarifas”.
Como a história das relações entre os Estados Unidos e a América Latina demonstra claramente, esta está longe de ser a primeira vez que Washington se intromete na região para satisfazer suas próprias tendências políticas. De fato, especialmente durante a Guerra Fria, vários tomadores de decisão dos EUA intervieram ativamente para apoiar regimes de direita amigos ou para remover do poder administrações consideradas inaceitavelmente independentes.
No entanto, esta foi a primeira vez na história recente que a posição oficial dos EUA é que uma nação estrangeira deve enfrentar punições econômicas severas, a menos que seu governo atual contorne ilegalmente o papel constitucional do judiciário para impedir uma grande investigação contra alguém acusado de crimes graves.
Trump-Bolsonaro: admiração mútua
É claro que o apoio aberto de Trump a Bolsonaro não é surpreendente, nem novo. Sua relação de admiração mútua e afinidade ideológica remonta à primeira campanha presidencial deste último em 2018, quando ele foi rotulado, para grande satisfação recíproca, como o “Trump dos Trópicos”.
Durante os dois anos seguintes, quando os seus mandatos coincidiram (2019-2000), ambos prometeram manter uma relação especial mútua, embora com poucas consequências — nenhum projeto bilateral significativo foi implementado.
Os dois líderes também compartilham a experiência de não terem conseguido um segundo mandato consecutivo e de terem apoiado o descarrilamento da transferência pacífica do poder.
Agora que Trump está de volta ao poder, Bolsonaro espera que o presidente dos EUA venha em seu socorro.
Buscando obter apoio explícito, o terceiro filho de Bolsonaro, Eduardo, membro da Câmara dos Deputados do Brasil e a voz internacional mais eloquente de sua família, tirou uma licença de suas funções legislativas e mudou-se para os EUA no início deste ano. Ele fez isso para fazer lobby em nome de seu pai com base no argumento falacioso de que Lula é um ditador de esquerda, que Bolsonaro enfrenta um julgamento motivado por questões políticas e que o governo dos EUA deveria agir contra o governo de Lula.
Dada a notificação tarifária de Trump e as razões explícitas que ele apresentou para isso, parece seguro assumir que as ações de Eduardo renderam dividendos.
Qual direção o Brasil tomará?
Assim como os EUA, o Brasil está profundamente dividido entre as linhas políticas de esquerda e direita. Portanto, não foi surpresa que as reações locais ao anúncio de Trump se manifestassem de acordo com os campos ideológicos.
Apesar das dificuldades legais de seu líder, os apoiadores de Bolsonaro continuam muito influentes na política, na mídia e em áreas econômicas importantes, como o setor do agronegócio. Não está claro se a decisão de Trump servirá para ajudar as pessoas a se unirem em apoio a Lula e contra um caso de interferência estrangeira. A declaração inicial de Lula de que o Brasil responderia da mesma forma foi vista com bons olhos entre seus apoiadores, embora a oposição e grande parte da mídia (https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/07/ 10/tarcisio-responsabiliza-lula-por-tarifa-de-trump-de-50percent-sobre-o-brasil.ghtml “”) atribuíram a culpa a Lula por não ter conseguido chegar a um acordo com o governo Trump.
Os principais industriais do poderoso estado de São Paulo, onde o poderoso aliado de Bolsonaro, Tarcisio de Freitas, atua como governador, serão os primeiros afetados pelas novas tarifas. Mas o impacto provavelmente se espalhará para outras atividades, inclusive no campo.
E, considerando que a maior parte das exportações agrícolas do país vai para a China em vez de para os EUA, a questão importante é se esses poderosos exportadores agirão de forma pragmática e trabalharão com Lula para ampliar o comércio com o gigante asiático e outros países, ou se continuarão a agir ideologicamente e a apoiar a parceria duradoura de Bolsonaro com Trump contra seus próprios interesses econômicos.
O diálogo tem sido uma marca registrada da diplomacia brasileira e, mesmo em meio a essas últimas trocas diplomáticas acaloradas, Lula reiterou sua disposição de negociar. Não está claro, porém, se as ações do governo Trump na América Latina serão conduzidas com base na racionalidade e em números reais, ou se elas realmente trarão de volta alguns comportamentos antigos, motivados ideologicamente, de escolher lados nas disputas políticas internas de nações estrangeiras. Se considerarmos a última carta de Trump pelo seu valor nominal, há motivos para preocupação.