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Cancelamento de Jimmy Kimmel é o último sinal de que estamos testemunhando o fim da democracia nos EUA

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Cancelamento de Jimmy Kimmel é o último sinal de que estamos testemunhando o fim da democracia nos EUA

O caminho da história nunca é linear. Mas suas curvas podem ser muito acentuadas.

É raro conseguir identificar o momento em que podemos dizer “este é o ponto em que tudo mudou”.

Então, chegamos ao ponto em que podemos dizer que os Estados Unidos estão em uma crise constitucional? A democracia americana falhou? Os EUA decaíram no autoritarismo?

Se as respostas a essas perguntas ainda não estavam claras, agora estão.

Sim. Está acontecendo. Agora mesmo.

Não dizemos isso em razão de um único incidente, mas de uma série de momentos e escolhas, eventos dentro de estruturas históricas conhecidas, que estão levando os EUA ao limite.

O assassinato de Charlie Kirk e as escolhas feitas pelo governo americano após o acontecimento são um desses momentos. Ficou imediatamente claro que o governo do presidente Donald Trump usaria o assassinato de Kirk como pretexto para acelerar seu projeto autoritário, transformando-o em arma para destruir oponentes, tanto reais quanto imaginários.

Em um discurso em vídeo da Sala Oval, Trump culpou a “esquerda radical” e prometeu reprimir as “organizações” que “contribuíram” para o crime. Seu vice-presidente, JD Vance, apresentou o podcast de Kirk, transformando-o efetivamente em uma ferramenta da mídia patrocinada pelo Estado.

Nesse programa, o vice-chefe de Gabinete da Casa Branca, Stephen Miller, prometeu “usar todos os recursos que temos no Departamento de Justiça, na Segurança Interna e em todo o governo para identificar, desmantelar e destruir essas redes”.

No universo MAGA, termos como “esquerda radical”, “redes” e “organizações” são códigos para qualquer forma de oposição ou dissidência — incluindo o Partido Democrata e a mídia tradicional. Vale a pena notar aqui que “esquerda radical” está agora mudando para abranger termos tão amplos como “de tendência esquerdista”, progressista ou, ainda mais subversivo, liberal.

O governo Trump promete perseguir a estrutura de arrecadação de fundos de sua oposição, amplamente definida. E o fará. Já está usando as agências do governo federal — incluindo o Federal Bureau of Investigation (FBI) e a Receita Federal – para ameaçar, punir e destruir aqueles que se opõem a ele.

E os momentos continuam surgindo. Na quarta-feira, o presidente da Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês), Brendan Carr, apareceu em outro podcast de extrema direita. Carr – um colaborador do Projeto 2025sugeriu que as emissoras que transmitem o programa Jimmy Kimmel Live! estavam sob a “possibilidade de multas ou revogação da licença da FCC” devido aos comentários de Kimmel sobre a morte de Kirk.

Naquela noite, a rede ABC, uma das maiores dos EUA, anunciou que o programa de Kimmel seria suspenso indefinidamente.

O momento envolvendo Kimmel segue o de Stephen Colbert. E segue outro momento no início da semana, quando Trump repreendeu o jornalista sênior da Australian Broadcasting Corporation – um dos maiores grupos de comunicação da Austrália -, John Lyons, dizendo agressivamente que ele estava “prejudicando” a Austrália e que diria isso ao primeiro-ministro australiano. Depois disso, a ABC australiana foi barrada da coletiva de imprensa que Trump concedeu em sua recente visita ao Reino Unido, supostamente por “razões logísticas”.

Em meio a essa enxurrada de momentos, pode ser difícil vê-los em contexto. Mas todos eles estão conectados – fazem parte de um projeto deliberado e cuidadosamente planejado para destruir qualquer pessoa ou coisa que se oponha ou mesmo questione a ortodoxia republicana, conforme definida por Trump.

O momento Kirk, o momento Kimmel e todos os outros devem ser entendidos nesse contexto mais amplo. Esta semana o governo Trump também anunciou que estava enviando a Guarda Nacional para Memphis, Tennessee. Provavelmente também enviará a Guarda Nacional para Chicago, como vem ameaçando há muito tempo. Ele já mobilizou a Guarda Nacional em Los Angeles e Washington DC.

Trump e seus comparsas estão cogitando abertamente enviar tropas para outras “cidades democratas”. O objetivo é semear o medo e suprimir a dissidência. E está funcionando.

Este mês, após uma reunião com seu homólogo russo Vladimir Putin, Trump prometeu acabar com o voto pelo correio. A Suprema Corte, alinhada com Trump, está prestes a revogar uma disposição fundamental da Lei do Direito ao Voto, destinada a impedir a discriminação racial. Ainda falta mais de um ano para as eleições legislativas de meio de mandato nos EUA.

Por incrível que pareça, estamos apenas oito meses dentro do segundo mandato de Trump. Mas os momentos continuarão a surgir, e a velocidade com que chegam provavelmente irá acelerar.

Juntos, eles pintam um quadro muito sombrio para o futuro da democracia americana, que já é bastante restrita. A supressão generalizada e coordenada da dissidência — e o efeito assustador que essa supressão tem — está destruindo a estrutura da vida política americana.

Está aqui. Está acontecendo. A história está se desenrolando diante dos nossos olhos.

Esta é uma mudança monumental. Para os Estados Unidos. E para o mundo.

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