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Universidade Federal do Pará (UFPA) provides support as an endorsing partner of The Conversation BR.
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Amanhã, dia 5 de setembro, é o Dia Mundial da Amazônia. Nesta semana que precede a data, o The Conversation Brasil publica uma série de artigos que discutem o passado, o presente e o futuro deste ecossistema que já é, há milhares de anos, o mais importante do mundo sob o ponto de vista geográfico e biológico. E que agora ganha ainda mais importância sob as cores da geopolítica, do abuso dos interesses econômicos, da necessidade de proteção dos povos originários e, sobretudo, da minimização dos efeitos das mudanças climáticas. No artigo abaixo, escrito por nada menos que seis reitores das universidades federais localizadas na região Amazônica brasileira, um retrato da urgência com que esses centros de pesquisa precisam ser incluídos e apoiados por qualquer política pública concebida para minimizar os efeitos da crise climática. Esse apelo dos reitores das universidades amazônidas foi traduzido num documento recém divulgado por eles, que ficou conhecido como “Carta de Porto Velho”.
A Amazônia ocupa um lugar central na regulação climática do planeta e guarda em seus territórios uma das maiores diversidades biológicas e socioculturais do mundo. E as Universidades Federais da Amazônia têm um papel estratégico e insubstituível na construção de soluções para a crise climática, para a defesa da biodiversidade e para a promoção da justiça social e ambiental.
Como centros de formação, pesquisa e extensão, essas instituições são parte ativa da resistência e da reinvenção de futuros sustentáveis. Com presença em mais de 180 municípios, as universidades federais da Amazônia formam uma ampla rede que representa a integração de mais de 13 mil docentes e 203 mil estudantes, distribuídos em 840 cursos de graduação e 323 programas de pós-graduação.
Essa capilaridade garante uma cobertura territorial ampla e estratégica, promovendo lideranças locais e levando educação, ciência, saúde e cidadania a áreas remotas. Muitas vezes, essas instituições são a única presença efetiva do Estado em regiões isoladas, atuando diretamente com comunidades tradicionais e contribuindo de forma concreta para melhorar as condições de vida das populações amazônicas.
Contribuições para o desenvolvimento
As universidades da Amazônia estão preparadas para contribuir com a formulação de políticas públicas para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, para a promoção da justiça climática, da bioeconomia e de uma transição energética justa.
Exemplos concretos dessa contribuição incluem o desenvolvimento de sistemas de monitoramento da biodiversidade e do clima (como os PPBios e os INCTs), o monitoramento de metais pesados por meio de iniciativas como o Instituto IAMER, a articulação de redes interinstitucionais como o Centro Integrado da Sociobiodiversidade Amazônica (CISAM), ações de ciência cidadã e vigilância participativa, tecnologias sociais de manejo sustentável e experiências pioneiras de integração entre saberes tradicionais e ciência acadêmica.
As universidades da Amazônia são também fundamentais para a formação de lideranças locais e para a articulação com os saberes tradicionais dos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos. São essas instituições que realizam a ponte entre a ciência e a sociedade, entre o conhecimento acadêmico e as práticas comunitárias, promovendo soluções em rede para problemas complexos.
Qualquer ação voltada à sustentabilidade, à conservação ambiental ou à justiça climática na região precisa necessariamente incluir e fortalecer as universidades federais.
Financiamento diferenciado
É essencial compreender que trabalhar e formar pessoas na Amazônia exige recursos e planejamento diferenciados. Embora seja um território de beleza e diversidade incomparáveis, os desafios logísticos são significativos. Muitos campi não possuem acesso por estradas e só podem ser alcançados por via fluvial ou aérea, tornando o deslocamento de pessoas, equipamentos e insumos extremamente complexo e oneroso.
Promover qualidade de vida e desenvolvimento sustentável na Amazônia requer políticas públicas robustas e financiamento adequado. Não podemos alimentar a utopia de tratar as instituições amazônicas com os mesmos parâmetros das regiões mais acessíveis do país. Precisamos de diferenciais nas linhas de fomento, mais recursos e apoio contínuo para garantir que possamos continuar fazendo a diferença em nossos territórios e para o futuro do planeta.
Carta de Porto Velho
Reunidos na Universidade Federal de Rondônia (UNIR), em junho de 2025, as reitoras e reitores das Universidades Federais da Região Norte atualizaram sua agenda política conjunta, reafirmando o compromisso coletivo com o desenvolvimento regional, a inclusão e a defesa dos povos da Amazônia.
A “Carta de Porto Velho” é um documento político e técnico que apresenta uma série de propostas urgentes e estruturantes para fortalecer o papel das universidades amazônidas frente à crise climática e às desigualdades históricas.
Entre os principais pontos apresentados na carta, destacam-se:
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Orçamento e financiamento: inclusão de um custo-aluno diferenciado para a Amazônia e garantia de orçamento discricionário que atenda às necessidades reais da região.
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Pessoal: criação urgente de cargos docentes e técnico-administrativos, distribuição equitativa de vagas e instituição de adicional de fronteira para servidores.
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Infraestrutura: conclusão das obras do PAC, ampliação de campi, construção de hospitais universitários e restaurantes estudantis em todos os campi da Amazônia.
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Conectividade e inovação: aceleração do Programa Norte Conectado e apoio a cursos estratégicos como Inteligência Artificial.
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Pós-graduação, pesquisa e extensão: lançamento de editais específicos, formação de redes interinstitucionais e alocação de no mínimo 10% dos recursos dos editais nacionais para projetos coordenados por universidades amazônidas.
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Internacionalização: editais exclusivos para a região, fortalecimento de parcerias com países do Sul Global e reconhecimento das universidades amazônidas como hubs de cooperação internacional.
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Inclusão e ações afirmativas: fortalecimento de políticas de acesso e permanência para estudantes de comunidades tradicionais, fomento à diversidade epistêmica e cultural.
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Saúde e assistência: financiamento permanente para serviços de saúde universitária e investimento em telemedicina.
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Fundos constitucionais e desenvolvimento regional: acesso direto aos Fundos Constitucionais para fomento a projetos de pesquisa e inovação. Ciência, clima e Amazônia: reconhecimento das universidades como atores centrais na adaptação climática e apoio à criação de centros de síntese de dados e políticas baseadas em evidências.
Universidades e as discussões globais
Diante da COP 30, as Universidades da Amazônia reivindicam participação ativa nas discussões globais sobre o clima. Reivindicam, também, que sejam vistas não como coadjuvantes, mas como protagonistas do futuro. Os investimentos em educação superior, em ciência e tecnologia não podem mais ser vistos como custos, mas como condição essencial para a sustentabilidade planetária.
Grande parte do conhecimento científico produzido sobre a Amazônia é gerado por pesquisadores e pesquisadoras vinculados às universidades públicas da região. Essas instituições concentram massa crítica instalada, infraestrutura de pesquisa e vínculos sólidos com os territórios e suas populações.
É imprescindível que sejam chamadas a participar de qualquer discussão sobre o futuro da Amazônia, especialmente em espaços como a COP 30 e na formulação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) do Brasil. Parcerias são bem-vindas e desejadas, mas a liderança das instituições amazônicas é condição essencial para garantir legitimidade, eficácia e justiça nas ações climáticas.
Colocar a Amazônia como protagonista das soluções climáticas exige o fortalecimento de quem conhece a floresta por dentro: suas universidades e suas gentes. Essas instituições podem contribuir diretamente para o cumprimento das metas brasileiras no âmbito das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), ao promoverem a conservação florestal com base em evidências, a valorização dos modos de vida sustentáveis e a geração de alternativas econômicas de baixo carbono. Sua atuação é essencial para consolidar uma transição justa que reconheça e integre os territórios, as populações e os conhecimentos amazônicos no enfrentamento da crise climática global.
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