A computação quântica promete transformar a forma como processamos informações e lidamos com problemas complexos. Nos últimos anos, essa tecnologia avançou rapidamente, saindo do campo teórico para experimentos cada vez mais sofisticados. Empresas e instituições de pesquisa têm investido pesado em protótipos de computadores quânticos, buscando superar os limites da computação clássica.
Recentemente, cientistas demonstraram a chamada supremacia quântica em tarefas específicas, resolvendo em poucos minutos problemas que levariam bilhões de anos para serem solucionados pelos melhores supercomputadores atuais. Apesar de ainda estar em fase experimental, a computação quântica está cada vez mais próxima de aplicações reais. Um dos desafios centrais para esse avanço está na busca por materiais magnéticos mais estáveis e eficientes.
Bits quânticos: o segredo da velocidade
Para entender a potência dos computadores quânticos, podemos compará-los aos convencionais. Nos computadores clássicos, a informação é armazenada em bits, que podem assumir os valores 0 ou 1. Já nos computadores quânticos, a menor unidade de informação é o qubit, que pode estar em qualquer combinação entre 0 e 1 ao mesmo tempo, devido ao princípio da superposição quântica.
Uma forma de visualizar isso é pensar num globo terrestre: um bit clássico poderia estar apenas nos polos Norte (0) ou Sul (1). Já um qubit pode estar em qualquer ponto da superfície do globo, que combinam diferentes posições de Norte e Sul. Essa propriedade aumenta exponencialmente a capacidade de cálculo dos computadores quânticos, permitindo resolver problemas que seriam impossíveis para as máquinas convencionais.
O papel do magnetismo na computação quântica
O funcionamento dos qubits depende de fenômenos magnéticos. O magnetismo dos materiais surge do comportamento dos elétrons desemparelhados, que possuem uma propriedade quântica chamada spin. O spin funciona como um pequeno ímã microscópico: quando esses pequenos imãs se alinham em uma direção, o material se torna magnético. Quando estão desorganizados ou se cancelam mutuamente, o material se encontra desmagnetizado.
Diferentes tipos de qubits exploram o magnetismo para armazenar e processar informações de formas distintas. Por exemplo, os Qubits de Spin são baseados no spin dos elétrons em materiais semicondutores, onde o estado “para cima” representa 1 e “para baixo”, 0. Esses qubits são manipulados por campos magnéticos e pulsos de micro-ondas.
Já os Qubits supercondutores são usados nos computadores quânticos mais avançados da IBM e do Google. Esses sistemas criam circuitos onde a corrente elétrica pode fluir em superposição de direções, gerando um campo magnético que pode ser controlado para armazenar e processar informação.
Outra abordagem usa átomos carregados eletricamente (íons) presos em campos eletromagnéticos. O magnetismo é essencial para controlar as interações dos íons e manipular os estados quânticos.
Os desafios dos qubits magnéticos
A principal barreira para o avanço dessa tecnologia é que os qubits são extremamente sensíveis à interação com o ambiente externo. Isso pode levar à perda rápida da informação quântica, chamada de “decoerência”. Para contornar esse problema, cientistas estão explorando diferentes materiais e mecanismos físicos para criar qubits mais estáveis, garantindo que os qubits mantenham sua coerência por mais tempo.
Outro problema é a necessidade de temperaturas extremamente baixas para manter a estabilidade dos qubits. Para tornar a computação quântica escalável e viável comercialmente, precisamos desenvolver materiais que mantenham suas propriedades quânticas em temperaturas mais altas.
Novos materiais quânticos: o que estamos estudando
No meu laboratório, no Departamento de Química da PUC-Rio, estudamos materiais magnéticos moleculares, que apresentam propriedades fundamentais que os tornam adequados para aplicações em computação quântica. Ao manipular as sínteses e escolher combinações específicas de metais e ligantes, buscamos criar materiais que mantêm a coerência por mais tempo, contribuindo para a reduzir erros em cálculos quânticos, melhorar a estabilidade e eficiência, permitindo operações lógicas mais rápidas e precisas.
Um dos materiais que descrevemos recentemente é um complexo de cobre, onde dois átomos desse metal estão conectados por um composto orgânico especial, que ajuda a organizar os átomos metálicos de forma específica. Descobrimos que assim os centros de cobre não interagem magneticamente entre si, o que sugere um bom isolamento do meio externo, uma propriedade desejável para a computação quântica.
Estamos também estudando íons de elementos da família dos lantanídeos, elementos que possuem propriedades magnéticas e ópticas interessantes para aplicações quânticas. Esses materiais são usados em lasers, telas de celulares e exames médicos, mas também têm potencial para contribuir no desenvolvimento de qubits mais robustos.
O futuro dos materiais magnéticos na computação quântica
Os avanços na criação de novos materiais magnéticos são promissores e importantes para tornar a computação quântica mais acessível. A expectativa é que, em breve, possamos operar qubits magnéticos em temperaturas mais altas, acelerando o desenvolvimento de sistemas quânticos aplicáveis em larga escala.
Além da computação quântica, esses materiais magnéticos são multifuncionais e extremamente versáteis. Eles também têm grande potencial em outras áreas, como armazenamento de dados, refrigeração magnética e na medicina, em carreamento de fármacos e técnicas de imagem por ressonância magnética.
Acredito que a interseção entre química, física e tecnologia é o que torna esse campo tão fascinante. Ao desvendar os segredos do magnetismo em nível molecular, estamos abrindo caminho para uma revolução tecnológica que pode transformar a maneira como processamos informações e resolvemos problemas complexos.