Ao navegar pelas redes sociais, é difícil não ver influenciadores vasculhando a despensa em busca de soluções de beleza “naturais”: esfoliantes com bicarbonato de sódio, bastões de alho para manchas, máscaras de pimenta caiena que prometem fechar os poros e eliminar o aspecto opaco da pele.
O apelo é óbvio. Por que pagar por um creme testado por dermatologistas quando ingredientes comuns têm propriedades antimicrobianas ou esfoliantes? Mas o que parece sensato em um vídeo de 30 segundos pode se transformar em desastres dolorosos e, às vezes, perigosos, quando feitos em casa.
Só porque algo é comestível não significa que seja seguro para a pele. Alho, pimenta, açafrão e seus vizinhos na prateleira de temperos podem conter compostos bioativos potentes, mas, na forma crua, eles são não refinados, instáveis e frequentemente muito agressivos para o delicado manto ácido que protege a pele humana.
Os químicos cosméticos profissionais isolam compostos vegetais biologicamente ativos, purificam-nos e misturam-nos em doses precisamente calibradas, adequadas ao pH natural da pele. Uma colher de pimenta caiena ou uma pitada de bicarbonato de sódio não oferecem esse controle. Espalhar pós da despensa no rosto pode causar queimaduras químicas, erupções cutâneas ou danos a longo prazo.
A concentração é o primeiro obstáculo. Uma colher de chá de bicarbonato de sódio, por exemplo, não tem nada em comum com um limpador testado quanto à segurança que pode conter menos de 1% de bicarbonato de sódio equilibrado por umectantes (ingredientes que atraem umidade) e ácidos.
Da mesma forma, uma pitada de pimenta caiena crua proporciona uma dose imprevisível de capsaicina, a molécula picante que os dermatologistas usam em cremes para dor nos nervos, mas apenas em concentrações rigorosamente controladas.
Os temperos de cozinha puros também vêm com seus próprios microrganismos: são produtos agrícolas processados a granel. Uma vez misturados com água ou óleo para criar uma máscara, eles podem se tornar caldos bacterianos, causando infecções em vez de um brilho saudável.
Bicarbonato de sódio: mais alcalino do que sua pele pode aguentar
O bicarbonato de sódio ilustra como um produto básico “inofensivo” pode alterar rapidamente a química da pele. Famoso na internet por suas propriedades antibacterianas suaves e antifúngicas, o bicarbonato de sódio é, na verdade, altamente alcalino.
A pele normal fica na faixa ácida de 4,5 a 5,5. Aplique uma pasta alcalina espessa e o pH dispara, perturbando os micróbios benéficos e provocando irritação e erupções cutâneas.
Estudos em humanos mostram que uma pasta de bicarbonato não alivia a coceira ou a vermelhidão da psoríase. Em bebês, banhos com bicarbonato de sódio para assaduras causaram alcalose metabólica hipocalêmica (baixos níveis de potássio no sangue), levando a convulsões e coma.
Alguns influenciadores dizem que a mesma pasta que alivia queimaduras é segura, mas ela pode ser perigosa. Há relatos de bicarbonato de sódio causando danos graves à pele — como queimaduras profundas e até mesmo morte de tecidos — quando aplicado em pele ferida ou lesionada.
Ainda mais alarmantes são as publicações que promovem o bicarbonato de sódio como uma terapia caseira contra o câncer, com base na teoria de que ele “neutraliza” a acidez do tumor. Altas doses orais perturbaram o ritmo cardíaco e causaram mortes.
Alho: remédio antigo, irritante moderno
O folclore do alho como “antibiótico natural” não é melhor. Os dentes de alho crus são ricos em compostos de enxofre, que se comportam como produtos químicos cáusticos. A aplicação direta produziu dermatite alérgica ou irritante e até mesmo queimaduras de terceiro grau nos lábios e pálpebras.
Quaisquer cicatrizes podem durar mais do que a espinha que deveriam curar.
Pesquisas sobre a alicina, um composto natural do alho, mostram-se promissoras como agente antimicrobiano e protetor do coração — potencialmente ajudando a baixar a pressão arterial, reduzir a inflamação e prevenir doenças cardíacas. Mas esse estudo utilizou extratos purificados em condições de laboratório — não um dente de alho esfregado diretamente na pele.
Pimentas: a capsaicina não é um truque de beleza
As pimentas apresentam um risco ainda maior. A capsaicina é licenciada para cremes para dores nervosas, mas mesmo os farmacêuticos alertam para o risco de queimaduras, vermelhidão e inchaço. Obviamente, nas cozinhas domésticas não há farmacêuticos.
Cozinheiros que manuseiam pimentas diariamente podem desenvolver mão de Hunan, uma dermatite intensamente dolorosa e com ardor. Apesar disso, alguns truques de beleza ainda recomendam máscaras de pimenta caiena para dar brilho. A capsaicina transportada pelo ar ou aplicada topicamente arde nos olhos, provocando espasmos involuntários, e a exposição prolongada pode causar lesões permanentes na córnea.
A inalação do pó provoca acessos de tosse e, com o tempo, inflamação pulmonar. Como a capsaicina penetra na pele, o uso repetido pode danificar as fibras nervosas periféricas — diminuindo sua capacidade de sentir calor ou dor — e interromper o fluxo sanguíneo normal, o que pode levar à irritação dos tecidos, retardar a cicatrização ou aumentar a sensibilidade. Também pode afetar a pressão arterial, especialmente em pessoas com problemas de saúde subjacentes.
Um exemplo notório destacou o perigo: uma mulher sofreu queimaduras vaginais agonizantes após usar, sem saber, um tampão contaminado com spray de pimenta que vazou em sua bolsa. Até mesmo pó de mostarda pode causar queimaduras de segundo grau quando aplicado incorretamente.
Roleta de temperos: manchas, queimaduras, dermatite
Temperos considerados mais suaves não são tão inofensivos assim. A canela é um produto popular para aumentar os lábios, mas os dermatologistas documentam dermatite de contato e queimaduras químicas. Máscaras de gengibre “brilhantes” deixam muitos usuários com pele vermelha e irritada.
O óleo de cravo, promovido como um remédio para manchas, causou lesões cáusticas. O açafrão pode causar erupções alérgicas, enquanto a curcumina da cúrcuma, celebrada online por seus benefícios anti-inflamatórios, muitas vezes causa dermatite e manchas amarelas brilhantes que permanecem por dias.
Os dermatologistas recomendam testar qualquer novo produto para a pele, mesmo óleos essenciais “puros”, na parte interna do braço por 48 horas.
Especiarias em pó também se espalham: um esfoliante de canela pode encher o ar com poeira irritante que se deposita nos olhos ou nas vias respiratórias, deixando você espirrando e com dor, em vez de radiante.
Respeite sua barreira
Os dermatologistas enfatizam a importância de proteger a barreira da pele: produtos de limpeza e hidratantes suaves e com pH equilibrado ajudam a manter o manto ácido que defende contra os germes. Seu médico ou farmacêutico pode orientá-lo sobre ingredientes vegetais comprovados, como niacinamida, aloe vera ou aveia coloidal, todos os quais oferecem benefícios para a pele sem causar ardência.
Da próxima vez que um influenciador te incentivar a “abandonar os produtos químicos” ou promover a “beleza limpa” e usar produtos de cuidados com a pele feitos com ingredientes naturais, lembre-se de que tudo é químico. Alguns pertencem ao seu prato de jantar, mas poucos pertencem ao seu rosto.