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Decisão da OTAN de aumentar gastos com defesa pode ter impactos para o Brasil

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Decisão da OTAN de aumentar gastos com defesa pode ter impactos para o Brasil

A decisão histórica da OTAN de elevar para 5% do PIB o objetivo de gastos em defesa, aprovada em sua cúpula em La Haia,dias 24 e 25 de junho de 2025, marca um novo capítulo na geopolítica internacional. Mais do que uma disputa entre grandes potências, esse movimento pode ter impactos diretos — e talvez inesperados — para o Brasil, que historicamente adota uma postura de potência pacificadora e não alinhada em termos militares.

A pressão pelo aumento de gastos militares partiu principalmente dos Estados Unidos, liderados por Donald Trump, que há anos cobram uma “divisão mais justa dos custos” dentro da OTAN. Agora, além dos 2% “antiguos”, os países europeus precisam caminhar para 5% do PIB em defesa até 2035 — um salto considerável para muitos aliados, como Espanha, que já afirmou publicamente não desejar (nem ter condições de) seguir esse ritmo.

A justificativa central é o aumento das ameaças no mundo: da Rússia à instabilidade no Oriente Médio, passando por desafios cibernéticos e novas tecnologias militares. Países como Polônia e Estônia, mais próximos da fronteira russa, já anunciaram que pretendem superar o patamar proposto, mesmo com impactos em outras áreas do orçamento nacional.

Para muitos brasileiros, o tema pode soar distante. Mas, em um mundo cada vez mais militarizado, o novo ciclo de gastos globais em defesa afeta diretamente questões do nosso dia a dia. O Brasil, até aqui conhecido pelo discurso de “potência pacífica”, pode se ver pressionado a rever sua política externa — seja para acompanhar o novo padrão internacional, seja para preservar sua autonomia.

Com países ricos investindo mais em armamentos, a competição por tecnologias estratégicas e cadeias produtivas globais também se intensifica. Isso, queiramos ou não, pode influenciar seriamente o comércio exterior, acordos diplomáticos e até mesmo a capacidade do Brasil atuar como mediador em crises internacionais. Em contextos de crise, países que não investem em defesa costumam ter menos peso em decisões multilaterais — como mostram episódios recentes envolvendo a Ucrânia e o Oriente Médio.

O novo ambiente global apresenta alguns dilemas. De um lado, aumentar o orçamento de defesa no Brasil implicaria deslocar recursos de áreas como saúde, educação e combate à pobreza — desafios ainda urgentes no país. Por outro, ficar de fora dessa agenda pode significar isolamento em debates estratégicos e perda de relevância internacional.

Ao mesmo tempo, o cenário pode ser uma oportunidade para o país investir em setores de alta tecnologia com dupla aplicação (dual: civil e militar), como cibersegurança, inteligência artificial e satélites. Empresas brasileiras de defesa, como a Embraer, já têm protagonismo internacional e podem até mesmo se beneficiar de um ambiente mais propício à inovação.

O desafio está em encontrar um equilíbrio: como proteger os interesses nacionais sem abrir mão da tradição pacifista? Como participar das cadeias tecnológicas globais sem se envolver em disputas geopolíticas que contrariam nossa política externa tradicional?

Outro ponto-chave é o impacto desse novo cenário nos BRICS e na inserção do Brasil na América do Sul. À medida que países como Índia e China também aumentam seus orçamentos militares, o grupo pode se dividir entre os que adotam o novo paradigma da OTAN e os que preferem uma via independente.

Na América do Sul, o Brasil tradicionalmente atua como liderança em iniciativas de defesa coletiva e resolução pacífica de disputas. O aumento dos gastos globais poderia forçar nossos vizinhos a reverem suas próprias políticas, afetando acordos regionais e a estabilidade da região.

E agora?

O futuro dependerá de escolhas políticas. O Brasil pode adotar uma postura de maior investimento em defesa, aproveitando para modernizar suas forças armadas e gerar inovação tecnológica. Ou pode reforçar sua vocação de mediador, apostando em mecanismos de segurança coletiva, diplomacia e cooperação regional.

O certo é que, num mundo mais militarizado, neutralidade passiva tende a ser cada vez menos sustentável. O debate público sobre o papel do país na nova ordem global é urgente — e precisa ir além das respostas automáticas, seja do lado do rearmamento ou do pacifismo. No fim das contas, a decisão da OTAN marca apenas o início de uma nova fase. Cabe ao Brasil decidir como responder, sem perder sua identidade nem sua capacidade de agir como protagonista em tempos de incerteza.

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