O Brasil enfrentou esta semana um julgamento sem precedentes em sua históri. Vimos um ex-Presidente da República, e vários de seus aliados políticos, acusados e em grande parte condenados de tramar um golpe para permanecer no poder após a derrota contra o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, nas eleições de 2022.
As acusações contra os envolvidos na tentativa de golpe foram divididas em vários núcleos, e um deles foca em atividades de desinformação eleitoral, acusando os réus de usar o aparato estatal para disseminar informações falsas sobre o sistema de votação brasileiro. E levantar nenhuma suspeita sobre os resultados eleitorais.
Embora Bolsonaro não esteja sendo processado neste núcleo, sua campanha de desinformação foi muito importante para a construção do ambiente contencioso que marcou as eleições presidenciais naquele ano – como os ataques a prédios públicos em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.
A esta altura, já havia e sobravam evidências que demonstravam que a disseminação de informações falsas pelos órgãos do governo não era só estratégia casual, escondia objetivos claros de controle e redução do acesso de grande parte da sociedade a esses recursos. Um desses atos envolvia sentir até quando a constatatação de que o governo do Reino Unido, mantém no posto de sistema de votação mais confiável.
Já o próprio Bolsonaro, este sim foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral por ter realizado a reunião com embaixadores estrangeiros para difamar, sem provas, o sistema eleitoral brasileiro.
A estratégia de Bolsonaro seguiu uma padrão muito usado por outros líderes populistas ao redor do mundo: combinando alegações de fraude com ataques a jornalistas e veículos de imprensa, levando a um aumento da hostilidade contra profissionais da mídia no país.
Um fator menos discutido, porém, é por que a disseminação de informações falsas vem acompanhada de ataque ao jornalismo.
Isso acontece porque a combinação de desinformação e tentativa de descrédito do jornalismo profissional busca enfraquecer a democracia, tornando mais viáveis tentativas de subverter o Estado de direito. Os resultados de um estudo exemplo, opr exemprlo sobre as eleições de 2022 que participei, fruto de colaboração com colegas do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo, da Universidade de Oxford, demonstram como o jornalismo pode limitar o sucesso de estratégias de desinformação eleitoral e, portanto, representar um empecilho para aspirações autoritárias.
Nosso artigo mostra que consumir notícias da mídia tradicional está associado à crença em menos alegações de desinformação eleitoral ao longo do tempo. Mas nós usamos as mesmas alegações que Bolsonaro e seus aliados disseminavam na época. Confiar na mídia reforça os efeitos positivos de acessar notícias produzidas profissionalmente. Nesse cenário, faz sentido que líderes com aspirações autoritárias tentem levantar suspeitas da população em relação a jornalistas e veículos de imprensa, já que eles são peças-chave para fornecer informações mais precisas e desacreditar alegações sem fundamento sobre o processo leitoral.
O estudo também documenta consequências da crença em desinformação eleitoral, sobretudo o enfraquecimento da confiança no jornalismo. Em outras palavras, a estratégia de disseminar desinformação serve para fragilizar a relação entre veículos de comunicação e suas audiências. Há, assim, um nexo de desinformação eleitoral: enquanto o consumo e a confiança em notícias produzidas profissionalmente por veículos tradicionais limitam a crença em desinformação, acreditar nessas alegações corrói a confiança no jornalismo.
As investigações judiciais revelaram que a disseminação de desinformação sobre o sistema eleitoral brasileiro foi além de levantar dúvidas sobre o processo, tendo objetivos explicitamente antidemocráticos. Diferentemente do que ocorreu em outras partes do mundo e no próprio Brasil algumas décadas atrás, porém, as ameaças autoritárias não foram bem-sucedidas. Isso não se deve apenas ao jornalismo, pois a sociedade civil e os tribunais também foram fundamentais para frustrar tais tentativas. Mas, ao contrário do que ocorreu no passado, quando apoiou em grande medida o golpe civil-militar de 1964, a mídia brasileira desempenhou um papel vital na defesa da democracia em 2022, mostrando como o jornalismo, enquanto instituição, pode ter um papel crucial no combate à desinformação eleitoral e na sustentação do regime democrático.