Image: Giovana Fleck, used with permission.
A posse no dia 22 de janeiro de 2025 dos governadores das dez províncias de Moçambique, uma semana após a posse do próprio presidente, encerrou mais um ciclo eleitoral injusto e marcado por violência. Apesar da oposição, marcada pela fiigura de Venâncio Mondlane, ter se recusado a reunir com o chefe da diplomacia de Portugal, o partido Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) e Daniel Chapo prosseguem apostando num esvaziamento das manifestações.
Portugal teve controle do país que seguiu como colônia até 1975, ano da independência moçambicana e quando a Frelimo passou a ter o poder político. Além disso, o país representa a maior comunidade de expatriados e empresários em Moçambique.
Apesar de uma das suas narrativas ser de “fazer as coisas diferentes, para obtermos resultados diferentes”, o novo Presidente de Moçambique, o mais novo de sempre e o primeiro sem vínculos com a Luta de Libertação, está a aplicar a mesma receita dos seus antecessores – no passado foi usada com Afonso Dhlakama e o partido Renamo – para enfrentar a contestação pós-eleitoral, o modelo português: debater muito o assunto, fazer pouco e esperar que Venâncio Mondlane e os seus apoiantes percam interesse nas manifestações. Dois dias após a posse de Chapo, Venâncio Mondlane apresentou duas dezenas de medidas para serem implementadas nos primeiros 100 dias do novo governo, alertando para novos protestos se não forem cumpridas.
O país africano realizou a 9 de outubro de 2024 as suas 7ª Eleições Gerais e Legislativas e 4ª Provinciais. Deliberadamente desorganizado pelo Secretariado Técnico de Administração Eleitoral(STAE) em cumplicidade com a Comissão Nacional de Eleições (CNE) o pleito serviu para eleger os candidatos do partido Frelimo, formação que governa desde que o país conquistou a independência.
Chapo vs Mondlane
Chapo, de 48 anos de idade, sem laços com a Luta de Libertação e com um curto percurso político – trabalhou como jornalista, docente e Conservador Notarial antes de ser nomeado Administrador do Distrito de Nacala-Porto, posteriormente Administrador do Distrito de Palma e mais tarde Governador da Província de Inhambane – era mais um “camarada” até ser escolhido no mais conturbado processo de sucessão no partido Frelimo para representar o rejuvenescimento e falar a linguagem dos jovens, que são metade da população em Moçambique.
Venâncio Mondlane, aos 50 anos de idade, representa o jovem moçambicano urbano, com educação superior, bom emprego mas insatisfeito com o partido que governa. Entrou para a política pelo Movimento Democrático de Moçambique, saltou para o partido Renamo para tentar tornar-se edil da Cidade de Maputo. Desafiou a liderança do antigo movimento de guerrilha para ser seu candidato presidencial e acabou por concorrer suportado pelo partido PODEMOS. Bom orador, quiçá pela experiência como pastor evangélico, conquistou os moçambicanos falando lhes directamente pelas redes sociais. Internacionalmente, Mondlane se identificou com políticos de extrema-direita como Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, de Donald Trump, atual presidente dos Estados Unidos.
Pós-eleições
Ao anunciar os resultados, ainda em outubro, o presidente da CNE, Carlos Matsinhe, reconheceu ter sido constatada “discrepância em relação ao numero de eleitores para cada uma das três eleições”, no entanto o órgão eleitoral, composto maioritariamente por membros e simpatizantes do partido Frelimo, decidiu que “não teria condições objectivas para levar a cabo acções investigativas para aferir o que realmente teria acontecido”.
Dois meses depois, a 23 de Dezembro, o Conselho Constitucional, também reconhecendo que houve fraude, “a CNE faltou ao cumprimento das suas responsabilidades de orientação, superintendência e fiscalização do processo eleitoral”, contudo “não influenciaram substancialmente os resultados” , o que validou vitória dos candidatos do partido Frelimo. Entidades e organizaçnoes internacionais, incluindo a União Europeia também apontaram irregularidades nas eleições de Moçambique.
Como é tradição, a oposição não reconheceu os resultados anunciados e deu início, 21 de outubro a contestação nas ruas, desta vez lideradas por Mondlane. Os protesto começaram antes do anúncio formal da CNE. Mondlane proclamou-se vencedor com base numa contagem paralela que nunca apresentou. Entretanto, seu advogado e o mandatário do partido PODEMOS, o qual apoiou Mondlane, foram assassinados no centro de Maputo o que precipitou as manifestações.
Inicialmente pacíficas, as manifestações degeneraram em confrontos entre cidadãos desarmados e as Forças de Defesa e Segurança que, para além de gás lacrimogéneo, usaram armas letais para dispersa-los matando mais de três centenas de moçambicanos, segundo dados coletados pela ONG Decide. Há discrepâncias com o número total apresentado pela polícia, de 96 mortos até a última semana de janeiro. A plataforma Decide cita, em detalhes, as circunstâncias que levaram à morte das vítimas – incluindo pessoas que foram atingidas por tiros dentro de suas próprias casas.
Novo governo sob tensão
A 15 de Janeiro, numa Praça da Independência militarizada e sob o olhar de apenas dois chefes de Estado estrangeiros, da África do Sul e da Guiné-Bissau, Daniel Chapo foi investido como o quinto Presidente de Moçambique. Historicamente, posses presidenciais em Moçambique tiveram a presença de chefes de Estado de Portugal e outros países vizinhos, da SADC (Southern Africa Development Community).
Dois dias antes, 210 dos 250 deputados haviam tomado posse para a 10ª Legislatura da Assembleia da República onde a nova maior força política passou a ser o partido PODEMOS. Os partidos Renamo e MDM, que boicotaram a investidura solene, acabaram por tomar posse no Parlamento a 29 de Janeiro.