A crescente indústria espacial privada e as tecnologias das quais a sociedade depende cada vez mais — redes de eletricidade, aviação e telecomunicações — são todas vulneráveis à mesma ameaça: o clima espacial.
O clima espacial abrange todas as variações no ambiente espacial entre o Sol e a Terra. Um evento climático espacial comum são as chamadas ejeções de massa coronal interplanetárias.
Essas ejeções são feixes de campos magnéticos e partículas que se originam do Sol. Elas podem viajar a velocidades de até 2.000 quilômetros por segundo e causar tempestades geomagnéticas.
As ejeções de massa coronal do Sol criam belas auroras — as luzes que às vezes podem ser vistas no céu a grandes latitudes —, mas também podem interromper as operações dos satélites, desligar a rede elétrica e expor astronautas a bordo de estações orbitais ou em futuras missões tripuladas à Lua e Marte a doses letais de radiação.
Sou heliofísico e especialista em clima espacial e minha equipe está liderando o desenvolvimento de uma constelação de satélites de última geração chamada SWIFT, projetada para prever com antecedência eventos climáticos espaciais potencialmente perigosos. Nosso objetivo é prever com mais precisão e antecedência condições climáticas espaciais extremas.
Os perigos do clima espacial
Interesses comerciais agora constituem uma grande parte da exploração espacial, com foco no turismo espacial, na construção de redes de satélites e projetos de extrair recursos da Lua e de asteroides próximos.
O espaço também é um domínio crítico para operações militares. Satélites fornecem recursos essenciais para comunicação militar, vigilância, navegação e inteligência.
À medida que países como os EUA passam a depender mais e mais da infraestrutura espacial, eventos climáticos espaciais extremos representam um risco ainda maior. Hoje, o clima espacial ameaça até US$ 2,7 trilhões em ativos globalmente.
Em setembro de 1859, o evento climático espacial mais poderoso já registrado, conhecido como evento Carrington, causou incêndios na América do Norte e na Europa ao sobrecarregar as linhas telegráficas. Em agosto de 1972, outro evento semelhante ao Carrington quase atingiu os astronautas em órbita da Lua. A dose de radiação poderia ter sido fatal. Mais recentemente, em fevereiro de 2022, a SpaceX perdeu 39 dos seus 49 satélites Starlink recém-lançados devido a um evento climático espacial moderado.
Monitores meteorológicos espaciais atuais
Os serviços meteorológicos espaciais dependem fortemente de satélites que monitoram o vento solar, composto por linhas de campo magnético e partículas provenientes do Sol, e comunicam suas observações de volta à Terra. Os cientistas podem então comparar essas observações com registros históricos para prever o clima espacial e explorar como a Terra pode responder às mudanças observadas no vento solar.
O campo magnético da Terra protege naturalmente os seres vivos e os satélites em órbita terrestre da maioria dos efeitos adversos do clima espacial. No entanto, eventos climáticos espaciais extremos podem comprimir — ou, em alguns casos, “descascar” — o escudo magnético da Terra.
Esse processo permite que as partículas do vento solar entrem em nosso ambiente protegido – a magnetosfera – expondo satélites e astronautas a bordo das estações espaciais a condições adversas.
A maioria dos satélites que monitoram continuamente o clima espacial terrestre orbita relativamente perto do planeta. Alguns satélites estão posicionados na baixa órbita da Terra, a cerca de 161 quilômetros acima da superfície, enquanto outros estão em órbita geossíncrona, a aproximadamente 40.000 km de distância.
A essas distâncias, os satélites permanecem dentro do escudo magnético protetor da Terra e podem medir com confiabilidade a resposta do planeta às condições climáticas espaciais. Mas para estudar mais diretamente o vento solar que chega, os pesquisadores usam satélites adicionais localizados mais longe – a até centenas de milhares de quilômetros da Terra.
Os Estados Unidos, a Agência Espacial Europeia (ESA) e a Índia operam satélites de monitoramento do clima espacial posicionados em torno do chamado ponto de Lagrange L1 – uma região do espaço a cerca de 1,45 milhão de quilômetros da Terra onde as forças gravitacionais do Sol e de nosso planeta se equilibram. A partir desse ponto estratégico, estes satélites de monitoramento meteorológico do clima espacial podem fornecer até 40 minutos de aviso prévio para eventos solares iminentes.
Alerta antecipado
Aumentar o tempo de alerta para além dos 40 minutos — o tempo de aviso prévio atual — ajudaria os operadores de satélites, planejadores de redes elétricas, diretores de voo, astronautas e os oficiais da Força Espacial a se prepararem melhor para eventos climáticos espaciais extremos.
Por exemplo, durante tempestades geomagnéticas, a atmosfera se aquece e se expande, aumentando o arrasto sobre os satélites na baixa órbita da Terra. Com um aviso prévio suficiente, os operadores podem atualizar seus cálculos de arrasto para evitar que os satélites caiam e queimem na atmosfera durante esses eventos. Com os cálculos de arrasto atualizados, os operadores de satélites poderiam usar os sistemas de propulsão dos satélites para manobrá-los para uma órbita mais alta.
As companhias aéreas poderiam alterar suas rotas para evitar expor passageiros e funcionários a altas doses de radiação durante tempestades geomagnéticas. E os futuros astronautas a caminho ou trabalhando na Lua ou em Marte, que não têm proteção contra essas partículas, poderiam ser alertados com antecedência para se protegerem.
Os amantes das auroras também apreciariam ter mais tempo para chegar aos seus destinos favoritos para observação.
Fronteira da Investigação do Clima Espacial
Minha equipe e eu temos desenvolvido uma nova constelação de satélites de clima espacial, chamada Fronteira da Investigação do Clima Espacial (Space Weather Investigation Frontier, ou SWIFT no original em inglês). A SWIFT colocará, pela primeira vez, um monitor de clima espacial além do ponto L1, a 2,1 milhões de quilômetros da Terra. Essa distância permitiria aos cientistas informar aos tomadores de decisão sobre quaisquer eventos climáticos espaciais que afetem a Terra até quase 60 minutos antes de sua chegada.
Os satélites com sistemas tradicionais de propulsão química e elétrica não conseguem manter uma órbita nessa localização — mais distante da Terra e mais próxima do Sol — por muito tempo. Isso porque eles precisariam queimar combustível continuamente para neutralizar a atração gravitacional do Sol.
Para resolver essa questão, nossa equipe passou décadas projetando e desenvolvendo um novo sistema de propulsão. Nossa solução foi projetada para alcançar de forma acessível uma distância mais próxima do Sol do que o tradicional ponto L1 e para operar de forma confiável por mais de uma década, aproveitando um recurso abundante e confiável: a luz solar.
O SWIFT usaria um sistema de propulsão sem combustível chamado vela solar para atingir sua órbita. Uma vela solar é uma superfície refletora fina como um fio de cabelo – simulando um espelho muito fino – que se estende por cerca de um terço da área de um campo de futebol. Ela é capaz de equilibrar a força das partículas de luz vindas do Sol, que a empurram para longe, com a gravidade do Sol, que a puxa para dentro.
Enquanto um veleiro aproveita a sustentação criada pelo vento que sopra sobre suas velas curvas para se mover pela água, uma vela solar usa o impulso dos fótons da luz solar, refletidos em sua grande vela brilhante, para impulsionar uma nave pelo espaço. Tanto o veleiro quanto a vela solar exploram a transferência de energia de seus respectivos ambientes para gerar movimento sem depender de propulsores tradicionais.
Uma vela solar poderia permitir que o SWIFT entrasse em uma órbita instável sub-L1 sem o risco de ficar sem combustível.
A NASA lançou com sucesso sua primeira vela solar em 2010. Essa demonstração no espaço, chamada NanoSail-D2, apresentava uma vela de 107 pés quadrados (10 m²) e foi colocada na baixa órbita da Terra. Nesse mesmo ano, a Agência Espacial Japonesa (JAXA) lançou uma missão com uma vela solar maior, a IKAROS, que desfraldou uma vela de 196 m² no vento solar e orbitou Vênus com sucesso.
A Planetary Society e a NASA deram continuidade ao seu projeto lançando duas velas na baixa órbita da Terra: a LightSail, com uma área de 344 pés² (32 m²), e o sistema avançado de velas solares compostas, com uma área de 860 pés² (80 m² ).
A missão de demonstração da vela solar da equipe SWIFT, a Solar Cruiser, será equipada com uma vela muito maior – ela terá uma área de 17.793 pés quadrados (1.653 m²) e será lançada já em 2029. Nós desfraldamos com sucesso um quadrante da vela na Terra no início do ano passado.
Para transportá-la para o espaço, a equipe dobrará meticulosamente e embalará firmemente a vela dentro de um pequeno recipiente. O maior desafio a ser superado será desfraldar a vela uma vez no espaço e usá-la para conduzir o satélite ao longo de sua trajetória orbital.
Se for bem-sucedida, a Solar Cruiser abrirá caminho para a constelação de quatro satélites da SWIFT. A constelação incluiria um satélite equipado com propulsão à vela, que seria colocado em uma órbita além de L1, e três satélites menores com propulsão química em órbita no ponto L1.
Os satélites ficarão estacionados indefinidamente no ponto L1 e além, coletando dados no vento solar sem interrupção. Cada um dos quatro satélites pode observar o vento solar de diferentes locais, ajudando os cientistas a prever melhor como ele pode evoluir antes de chegar à Terra.
Como a vida moderna cada vez mais dependente da infraestrutura espacial, continuar investindo na previsão do clima espacial pode proteger as tecnologias espaciais e terrestres.