A publicação, no último dia 19 de maio, do decreto 12.456, que dispõe sobre a oferta de Educação a Distância (EaD) por instituições de ensino superior em cursos de graduação no Brasil, gerou uma grande repercussão na mídia especializada em educação. A maioria dos veículos e analistas que se posicionaram concorda que o decreto traz avanços, embora outros observem que tais progressos ainda são muito tímidos. Ou mesmo atrasados.
Como mostra o gráfico abaixo, a oferta de EaD tem avançado enormemente no Brasil, chegando a ultrapassar a modalidade presencial em muitas instituições, especialmente as privadas.Esta realidade faz com que a discussão vigente hoje – o debate entre a qualidade do ensino presencial e a sua versão à distância – corra o risco de perder relevância por conta da vantagem incontestável que o EaD oferece em termos de alcance, capilaridade e custo.
Porém, além do avanço tecnológico e das possibilidades de capilarização do ensino através das novas tecnologias, o novo novo decreto provoca também uma discussão que pode nos levar a novas formas de oferecer educação de qualidade para contingentes populacionais ainda maiores.
Uma história que começa em 1904
A história da educação a distância no Brasil remonta ao começo do século 20. Em 1904, foram instaladas as chamadas escolas internacionais, instituições privadas que ofereciam cursos por correspondência. Na década de 30, a utilização da EaD se amplia com a utilização da radiodifusão com fins educativos através da criação da Rádio Escola Municipal, uma iniciativa de Edgard Roquete-Pinto. Na sequência foi criado o Instituto Monitor, que oferecia cursos técnico-profissionais considerados os mais antigos e conhecidos mecanismos de EaD no país.
Nos anos 1970, surgiram iniciativas como o Instituto Universal Brasileiro, que oferecia cursos para diversas áreas. E nos anos 1990, com a popularização da internet, a EaD ganhou muito mais força, permitindo aulas online e maior interação entre alunos e professores.
Ao longo do tempo e à medida que os recursos tecnológicos surgiam e se ampliavam, a EaD foi se consolidando como uma modalidade de ensino cada vez mais popular. Em 1996, a instituição da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) que regulamentou o sistema educacional brasileiro, reconhece oficialmente a EaD como uma modalidade válida de ensino. Em 2005 o Decreto 5.622 estabeleceu regras para cursos EaD no ensino superior, garantindo maior controle e qualidade. Em 2017, o Decreto 9.057 flexibilizou a oferta de cursos, permitindo que instituições expandissem suas graduações nessa modalidade.
Falta debate sobre o EAD nas universidades públicas
Apesar do avanço, especialmente no setor privado, as instituições públicas de ensino superior até hoje carecem de uma discussão mais ampla sobre o uso dessa modalidade de ensino. Na maioria das universidades que ofertam EaD existe um setor específico – uma superintendência, secretaria ou Centro onde os cursos na modalidade a distância são geridos. Mas a gestão desses cursos deveria estar nas Pró-Reitorias de Graduação, lado a lado com os cursos presenciais.
Apesar dos avanços na regulamentação, o decreto 12.456/2025 continua a tratar a EaD como um serviço de menor relevância oferecido pelas instituições, quando devería estar centrado na evolução e na qualidade do serviço. Com o atual avanço tecnológico, e uma capilarização cada vez maior de universidades públicas espalhadas por todas as regiões do Brasil, já existem condições para que haja uma rede pública de EaD mais bem fundamentada em todos o território brasileiro. Uma rede que proporcione um acompanhamento mais próximo e uma atuação de professores com maior interação com os alunos.
O exemplo da Universidade Federal do Sul da Bahia com a Rede Anísio Teixeira de Colégios Universitários
A UFSB, desde a sua criação, possui polos chamados de Rede Anísio Teixeira de Colégios Universitários (Rede CUNI). Esses polos são fruto de um acordo de cooperação com a Secretaria Estadual de Educação da Bahia, que cede salas em colégios do estado nos diversos municípios da área de abrangência da universidade. Essas salas são equipadas pela UFSB com computadores e conexão de internet, e os estudantes recém chegados na universidade que têm dificuldade de deslocamento para os campi podem iniciar suas aulas de forma remota, sincronizada com o ensino presencial, a partir dessas salas. Isso é possível por conta da legislação, que estabelece que nos cursos presenciais haja um percentual de alunos à distância. Hoje, a UFSB conta com 12 polos de EaD em diferentes municípios, oferecendo todos os cursos disponíveis na universidade.
Graças a essa experiência, no dia 12 de março de 2025 a UFSB pôde finalmente aprovar uma resolução que estabelece oficialmente sua política de EaD. Essa aprovação ocorreu depois de quase um ano de discussão,e estabelece regras para a oferta de cursos, com número definido de alunos por turma, evitando excessos e permitindo ao professor fazer um acompanhamento de qualidade dodesenvolvimento de cada estudante.
Alguns pontos presentes na resolução trazem no seu conceito a ideia de que os cursos a distância podem e devem ter o professor como principal interlocutor na mediação com os estudantes. Ela também estabelece as abordagens metodológicas de EaD: Hibrida, Metapresencial (aulas síncronas com o ensinopresencial) e interativa.
A aprovação dessa resolução trouxe à universidade uma possibilidade de trabalhar na perspectiva de oferta de uma EaD onde os estudantes poderão ser acompanhados integralmente no seu desenvolvimento acadêmico, com os professores atuando de forma ativa nas aulas para todas as categorias de alunos. Os estudantes do EaD poderão inclusive ainda participar de projetos de pesquisa e extensão, com direito a bolsas.
Dessa forma acreditamos que podemos ter cursos que se aproximem cada vezmais dos cursos presenciais, tanto na qualidade pedagógica quanto na integração nos alunos com a universidade.
Oferta de EaD no país chega a ultrapassar a modalidade presencial em muitas instituições, mas essa realidade não pode prejudicar o esforço pela equiparação de qualidade com o ensino presencial