O Prêmio Nobel de Química de 2025, anunciado na última quarta-feira, contemplou três cientistas pioneiros no desenvolvimento das redes metalorgânicas, ou MOFs (sigla para o inglês metal-organic frameworks): Susumu Kitagawa, da Universidade de Kioto, Japão; Richard Robson, da Universidade de Melbourne, Austrália; e Omar M. Yaghi, da Universidade da Califórnia em Berkeley, EUA.
Mas o que são MOFs? As redes metalorgânicas são uma subclasse específica dos polímeros de coordenação, compostas de íons ou clusters metálicos e ligantes coordenados em um arranjo infinito. As MOFs são, por definição, polímeros de coordenação tridimensionais que apresentam alta porosidade e cristalinidade. Mas diversos trabalhos na literatura estendem essa classificação a polímeros bidimensionais, em virtude das propriedades análogas às observadas nas MOFs tridimensionais. Essas estruturas podem ser projetadas com uma variedade de formas e tamanhos, resultando em uma vasta gama de propriedades funcionais.
Como foi o desenvolvimento das MOFs?
Desde a década de 1980, com o advento da química supramolecular, estruturas com arranjos específicos, como as cadeias poliméricas, começaram a ser produzidas. Mas o desenvolvimento das MOFs começou de fato na década de 1990, com o trabalho pioneiro de Omar Yaghi e sua equipe. Então, eles obtiveram compostos contendo ânions (íons ou moléculas com carga líquida negativa) e policarboxilatos – um tipo de molécula orgânica derivada dos ácidos carboxílicos com uma estrutura molecular que lembra um “pente” – de alta porosidade.
Estes foram um dos primeiros exemplos de MOFs. Mas o primeiro material do tipo a mostrar altíssima área superficial (>3000 m²/g) e estrutura altamente ordenada só veio em 1999. Conhecida como MOF-5, ela é baseada em clusters de óxido de zinco (Zn₄O) e ligantes tereftalato, proveniente do ácido tereftálico.
A MOF-5 provou que era possível criar materiais porosos cristalinos previsíveis e, desde então, a pesquisa sobre MOFs se expandiu. Isso levou à criação de milhares de novos compostos com diferentes metais (zinco, cobre, ferro, zircônio, lantanídeos etc) e ligantes (oxigênio, doadores de nitrogênio etc), otimizando suas propriedades para aplicações específicas.
Como funcionam as MOFs?
As MOFs funcionam devido à sua estrutura porosa, que permite a captura e armazenamento de moléculas ou íons (átomos com carga elétrica). Os íons metálicos presentes em suas estruturas atuam como sítios de coordenação, enquanto os ligantes orgânicos conectam esses centros, formando uma rede tridimensional. A alta área superficial e os espaços livres (poros) entre as estruturas permitem que as MOFs interajam com gases e líquidos, favorecendo processos como adsorção e separação. O design modular das MOFs permite a personalização das propriedades, dependendo da escolha dos metais e dos ligantes.
Tudo isso permite diversas aplicações atuais e potenciais. Entre elas, o armazenamento e separação de gases – como hidrogênio (H₂), dióxido de carbono (CO₂), metano (CH₄) – que torna as MOFs ferramentas poderosas na luta contra o aquecimento global e as mudanças climáticas e a transição energética.
Mas não é só isso. As propriedades das MOFs também abrem caminho para seu uso em processos químicos como a catálise heterogênea – em que catalisador e reagentes estão em diferentes fases físicas, como um catalisador sólido promovendo uma reação entre reagentes gasosos ou líquidos -; na medicina, com a liberação controlada de fármacos; no sensoriamento químico e luminescente; e até na computação quântica e spintrônica – objeto do Nobel de Física deste ano – com alguns complexos com metais paramagnéticos.
Pesquisas com MOFs no Brasil
Atualmente, também podemos pensar no conceito de MOFs multifuncionais, onde as propriedades podem ser projetadas para atender tecnologias emergentes. Em trabalho publicado recentemente por Marta Orts-Arroyo e colaboradores, novas MOFs de lantanídeos funcionam como sensores quânticos luminescentes e magnéticos, capazes de detectar seletivamente aminas biogênicas – compostos orgânicos de baixo peso molecular presentes em alimentos como peixes, queijos e vegetais fermentados que atuam como índices de qualidade e frescor – por meio de respostas ópticas e magnéticas moduladas pela adsorção de vapores.
No Laboratório de Síntese e Estudo de Compostos Magnéticos Moleculares (LabCMM) que eu coordeno na PUC-Rio, trabalhamos com várias estruturas poliméricas, incluindo trabalhos de colaboração. Iniciamos neste mês um projeto com financiamento da Agência Nacional do Petróleo (ANP) para bolsistas de pós-graduação sobre a captura de CO2 pelas redes metalorgânicas. As MOFs são consideradas materiais revolucionários e, embora a literatura já apresente estudos bem estabelecidos, uma riqueza de possibilidades ainda pode ser explorada.