O governo federal voltou a flertar recentemente com uma saída “fácil” para um problema complexo: aumentar impostos para cobrir desequilíbrios fiscais. A tentativa de criar uma alíquota extra de IOF sobre operações de câmbio, barrada pelo Supremo em 4 de julho, ilustra bem esse padrão recorrente. Sempre que a arrecadação decepciona ou os gastos sobem, a resposta parece ser a mesma: tributar mais.
Mas essa lógica está esgotada. E, pior, ignora a raiz do problema: o padrão de gasto público brasileiro, marcado por rigidez orçamentária, ineficiência e baixa entrega social. O mais grave é que essa estratégia não é nova — já foi tentada inúmeras vezes, com resultados limitados. Se aumentar impostos fosse suficiente para resolver o desequilíbrio fiscal, o problema já estaria superado. Mas ele persiste. É cada vez mais evidente que elevar a carga tributária, por si só, não resolve a questão — apenas posterga decisões difíceis e aprofunda a desconfiança da sociedade.
O Brasil já arrecada muito: mais de 30% do PIB em 2023, segundo dados do Tesouro Nacional. Esse nível é semelhante ao de países da OCDE como Portugal e Espanha. No entanto, o retorno em serviços públicos é claramente inferior. Em rankings de eficiência governamental, como o do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa posições bem abaixo de países com carga menor e estrutura mais enxuta.
A raiz do problema está em como gastamos. Mais de 90% da despesa primária federal é obrigatória, ou seja, está fora do alcance de ajustes rápidos. Além disso, há pouca ou nenhuma avaliação sistemática de impacto ou efetividade da maioria dos programas governamentais. Benefícios fiscais, subsídios, folha de pagamento e aposentadorias se acumulam nas contas públicas sem uma estratégia clara de priorização.
O exemplo mais emblemático é a despesa com pessoal. Segundo o Banco Mundial, o Brasil gasta mais de 13% do PIB com salários e aposentadorias no setor público — bem acima da média da América Latina (9%) e até de países europeus como a Alemanha (10%). Isso deixa pouca margem para investir em infraestrutura, educação básica e inovação: pilares do crescimento sustentável.
Ignorar esse cenário e insistir em mais tributos é não apenas ineficaz — é uma escolha perigosa. Primeiro, porque esbarra em um limite econômico: a capacidade de extrair mais receita de contribuintes e empresas que já enfrentam elevada carga tributária. Segundo, porque tem efeito adverso sobre o investimento, a confiança e o próprio dinamismo da economia. Em vez de estimular crescimento e ampliar a base de arrecadação, o aumento de impostos pode retrair ainda mais a atividade, inibindo e desincentivando o setor produtivo.
Reforma também de gasto público
A reforma tributária em curso é necessária, sem dúvida. Mas será insuficiente se não vier acompanhada de uma reforma do gasto público. Medidas pontuais de aumento de arrecadação, como a tentativa recente de elevar o IOF, são paliativos que não resolvem o desequilíbrio estrutural das contas públicas. A insistência nesse tipo de expediente revela uma resistência política em lidar com o essencial: um Estado caro, pouco eficiente e excessivamente engessado.
Sem enfrentar o gasto, qualquer avanço na arrecadação será limitado, temporário e insuficiente para garantir equilíbrio fiscal de forma sustentável. Uma combinação de arrecadação mais racional com um gasto mais eficiente parece ser a única saída consistente para garantir equilíbrio fiscal sem penalizar ainda mais os contribuintes.
É compreensível que discutir corte de gastos seja politicamente sensível. Envolve enfrentar interesses organizados, rever privilégios e fazer escolhas difíceis. Mas um país que evita essas decisões acaba prisioneiro de soluções improvisadas — como um aumento súbito de imposto que nem sempre se efetiva e, mesmo que avance, tende a ser inócuo.
O Estado brasileiro custa caro e entrega pouco. O contribuinte sente no bolso, mas não vê retorno. Aumentar impostos nesse contexto é pedir mais de quem já cedeu muito, sem muita escolha — e sem resolver o essencial. Reduzir gastos não significa cortar direitos, mas fazer escolhas melhores, com mais foco, avaliação e responsabilidade. É disso que precisamos: menos improviso, mais estratégia.