Os preços personalizados (surveillance pricing no original em inglês) têm dominado as manchetes recentemente. Anúncio da Delta Air Lines de que usará inteligência artificial para definir preços individualizados de passagens gerou preocupações generalizadas sobre empresas usarem dados pessoais para cobrar preços diferentes por produtos idênticos. Conforme relatado pelo The New York Times, essa prática envolve as empresas rastreando tudo, desde suas reservas de hotel até seu histórico de navegação, para determinar quanto você está disposto a pagar.
A reação foi rápida. Legisladores democratas responderam com indignação, com o deputado do Texas Greg Casar apresentando uma legislação para proibir a prática. Enquanto isso, o novo presidente da Comissão Federal de Comércio (FTC) do presidente Donald Trump encerrou audiência pública sobre o assunto, sinalizando que o pêndulo regulatório pode se afastar totalmente da supervisão e regulamentação.
O que falta nessa disputa política é uma análise mais profunda da economia. Como professor de administração que pesquisa estratégias de preços, acho que o debate deixa de lado nuances importantes. Os oponentes dos preços personalizados ignoram alguns benefícios potenciais que poderiam tornar os mercados mais eficientes e, contraintuitivamente, mais equitativos.
O que é realmente o preço personalizado?
O preço personalizado é diferente do preço dinâmico tradicional, em que os preços aumentam para todos em momentos de pico de demanda, como vemos em aplicativos de transporte. Em vez disso, ele usa dados pessoais – histórico de navegação, localização, padrões de compra e até mesmo tipo de dispositivo – para cobrar um preço único com base no que os algoritmos preveem que você está disposto a pagar.
O objetivo é descobrir o “preço de reserva” de cada cliente – o máximo que ele pagaria antes de desistir da compra. Até recentemente, isso era extremamente difícil de fazer, mas a coleta de dados moderna tornou isso cada vez mais viável.
Uma investigação da FTC descobriu que as empresas rastreiam comportamentos altamente pessoais dos consumidores para definir preços individualizados. Por exemplo, um novo pai que pesquisa “termômetros para bebês” pode encontrar produtos mais caros na primeira página dos resultados do que alguém que não é pai. Não é surpreendente que muitas pessoas achem isso injusto.
Um imposto progressivo não intencional
Mas considere o seguinte: os preços baseados em vigilância de dados também significam que os clientes ricos pagam mais por produtos idênticos, enquanto os clientes de baixa renda pagam menos. Isso poderia ajudar a atingir os objetivos de redistribuição normalmente perseguidos pelas políticas governamentais. As empresas farmacêuticas já fazem isso globalmente, cobrando mais dos países mais ricos por medicamentos idênticos para tornar os medicamentos acessíveis nas nações mais pobres. A precificação baseada em vigilância de dados poderia funcionar como um sistema de imposto progressivo do setor privado.
Os economistas chamam isso de “discriminação de preços”, mas muitas vezes isso ajuda os consumidores mais pobres a ter acesso a produtos que, de outra forma, eles não teriam condições de comprar. E, ao contrário dos programas governamentais, esse tipo de redistribuição não requer financiamento dos contribuintes. Quando o algoritmo da Amazon me cobra mais do que de um estudante universitário pelo mesmo notebook, ele está efetivamente executando um programa de subsídios baseado na renda – financiado pelos consumidores.
O problema da economia de dois níveis
Na minha opinião, a preocupação mais legítima sobre os preços personalizados não é a sua existência, mas a forma como são implementados. Os varejistas online podem ajustar os preços em tempo real, enquanto as lojas físicas continuam em grande parte presas a preços uniformes. Imagine a fúria dos clientes se os preços de checkout da Target variassem de pessoa para pessoa com base nos dados de seus smartphones: poderia haver caos nas lojas. Essa divisão entre o digital e o físico também poderia criar vantagens injustas para empresas com conhecimento tecnológico, deixando os varejistas tradicionais para trás. Isso levantaria questões de justiça para os consumidores e também para os varejistas.
Isso está relacionado a outra força que poderia limitar até onde os preços personalizados podem chegar: a arbitragem, ou a prática de comprar algo onde é mais barato e vendê-lo onde é mais caro.
Se um sistema cobra consistentemente US$ 500 de clientes ricos por itens que custam US$ 200 para clientes pobres, isso cria oportunidades para intermediários empreendedores explorarem essas diferenças de preço. Serviços de compras pessoais, cooperativas de compra ou mesmo redes de amigos e familiares poderiam arbitrar essas diferenças, proporcionando aos clientes ricos acesso a preços mais baixos e dividindo a economia. Isso significa que os preços baseados em vigilância dados não podem discriminar de forma muito agressiva — as forças do mercado irão corroer diferenças excessivas de preço.
É por isso que acredito que a solução não é proibir totalmente os preços personalizados, mas monitorar como eles são colocados em prática.
O ponto ideal da regulamentação
O momento político atual oferece uma oportunidade peculiar. Com os republicanos focados na inovação em IA e os democratas fixados em proibições, há espaço para uma posição mais sofisticada que abrace a redistribuição baseada no mercado e, ao mesmo tempo, exija fortes proteções ao consumidor.
Na minha opinião, uma regulamentação inteligente exigiria que as empresas divulgassem quando os dados pessoais influenciam os preços e proibiria a discriminação com base em características protegidas, como raça, cor ou religião — e essa lista precisa ser criada com extremo cuidado. Isso preservaria os benefícios da eficiência e, ao mesmo tempo, evitaria abusos.
A fixação de preços com base no desespero ou na necessidade também levanta questões éticas únicas. Cobrar mais de um cliente mais rico por uma corrida de táxi é uma coisa; cobrar mais de alguém apenas porque a bateria de seu celular está fraca e ele corre o risco de ficar sem poder pedir um carro de aplicativo é outra.
A meu ver, a distinção entre capacidade de pagamento e urgência da necessidade deve se tornar a pedra angular da regulamentação. Embora distinguir as duas coisas possa parecer desafiador, está longe de ser impossível. Seria útil se os clientes tivessem o poder de denunciar práticas exploradoras, usando mecanismos semelhantes às proteções contra preços abusivos existentes.
Uma estrutura regulatória sólida também deve esclarecer a diferença entre preços dinâmicos e exploração baseada em vigilância de dados. Os preços dinâmicos são uma prática padrão há muito tempo: as companhias aéreas cobram tarifas mais altas de todos os viajantes de última hora, independentemente de suas circunstâncias. Mas considere dois passageiros comprando passagens no mesmo dia – um correndo para um funeral, outro planejando férias espontâneas. No momento, as companhias aéreas podem usar a tecnologia para identificar e explorar as circunstâncias desesperadoras do participante do funeral.
O desafio político é preciso: podemos elaborar regulamentações que impeçam as companhias aéreas de explorar os enlutados e, ao mesmo tempo, permitam que os varejistas ofereçam descontos em notebooks para famílias de baixa renda? A resposta determinará se a precificação baseada em vigilância de dados se tornará uma ferramenta de equidade ou de exploração.