Quais são os riscos ambientais e econômicos envolvidos em um vazamento de óleo em uma região de alta biodiversidade marinha e um dos mais importantes polos de manutenção de culturas tradicionais, como caiçaras, indígenas e quilombolas?
Quando pensamos em acidentes com óleo, logo nos vem à mente alguns casos como os que ocorreram no Alasca (Exxon Valdez), na baía de Guanabara (REDUC) e mais recentemente, ao longo da costa nordeste brasileira.
Na Baía da Ilha Grande, a presença de um dos maiores terminais de óleo do Brasil, a intensa movimentação de navios, e a maior frota de turismo-recreio da costa brasileira coloca em risco uma biodiversidade marinha exuberante e ainda não completamente conhecida.
Apesar dos desafios, muitas espécies novas
Para responder a esta pergunta e enfrentar este desafio, nosso grupo de pesquisadores de três universidades do Rio de Janeiro (UERJ, UFRRJ e UFRJ), desenvolve um complexo estudo nas águas e praias da Baía da Ilha Grande. Este estudo envolve análises da qualidade de suas águas, estudo da biodiversidade marinha, bioinvasão, contaminação por microplásticos e, claro, a produção de muito material audiovisual a ser utilizado em exposições e divulgação.
Apesar de bem estudada, muitas surpresas boas tem sido registradas em suas águas. Muitas espécies novas para a Ciência, como a poliqueta Sphaerosyllis lanai e a esponja Chalinula tamoiensis. Mas também, algumas espécies invasoras indesejadas, provavelmente introduzidas por navios que chegam a essa região, como o mexilhão verde Perna viridis, a ostra Saccostrea cucullata e a recém chegada ascídia Microcosmus squamiger, esta última prevista por Daniel Lins e outros autores, em 2018, que avaliaram que esta espécie poderia alcançar o Atlântico Sul ocidental.
E infelizmente, a Baía da Ilha Grande foi um desses locais. A bioinvasão, que é a chegada de espécies que não são de uma determinada região, pode causar muitos impactos pois compete com as espécies locais, reduzindo a disponibilidade de habitat e, com isso, muitas funções ecológicas e econômicas.
Mas outras espécies, especialmente de peixes e moluscos com grande importância ecológica e econômica têm tido cada vez menos registros, como badejos, garoupas, budiões, polvos e mexilhões, isso mesmo nas áreas de proteção. Sem contar os crustáceos de alto valor econômico como lagostas, praticamente desaparecidas da baía. A pesca excessiva e poluição contribuem para essa diminuição. Aliás, a poluição por resíduos sólidos descartados incorretamente também tem sido alvo de pesquisas e de ações de mobilização ambiental.
Microplástico
Além da rica diversidade, as águas, sedimentos e animais da Baía da Ilha Grande não estão livres de um poluente quase invisível: o microplástico, que têm sido seguidamente detectado nos estudos em animais como ascídias e crustáceos, ou nos sedimentos de praias e do fundo, ou nas próprias águas da baía. Microplásticos são partículas plásticas menores que 5mm e tem diversas composições e formatos. Eles podem ser ingeridos por diversos animais e tem potencial de chegar até o ser humano. Já foram encontradas partículas de microplásticos em órgãos como pulmões, placenta e, até mesmo, no cérebro humano.
Mas a Baía da Ilha Grande é resiliente e ainda exibe excelente qualidade ambiental, com muitas espécies importantes, como o coral-cérebro Mussismilia hispida, a estrela do mar Oreaster reticulatus e muitos outros invertebrados e vertebrados. Recentemente, a região teve um reconhecimento extremamente importante que foi sua inclusão como um sítio de observação e proteção de tubarões.
Além das ações de pesquisa, cientistas do nosso grupo também desenvolvem atividades de divulgação científica junto às escolas e comunidades da região; fazem parte dos conselhos de diversas unidades de conservação e ainda, prestam importantes serviços às prefeituras, órgãos ambientais e associações de moradores.
Recentemente, foi divulgado na imprensa que um acordo judicial de R$ 24 milhões de reais foi firmado pela Transpetro, e o dinheiro deverá ser aplicado exclusivamente em projetos de mitigação, prevenção, monitoramento e recomposição dos ecossistemas da Baía da Ilha Grande. Exatamente o que estamos realizando e esperamos que parte desta verba possa financiar nossas atividades que muito tem contribuído para o entendimento dos impactos dos vazamentos passados e potenciais riscos futuros.
A publicação deste artigo contou com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).