O pontífice de 88 anos estava bem ciente de seu estado frágil e de sua idade avançada. Já em 2015, o Papa Francisco havia expressado o desejo de ser sepultado na Basílica de Santa Maria Maggiore, uma igreja do século V em Roma dedicada à Santíssima Virgem Maria. Ele era tão devoto de Maria e de sua basílica que, após cada uma de suas mais de 100 viagens ao exterior, ele a visitava depois de retornar a Roma para orar e meditar.
Nenhum papa foi enterrado em Santa Maria Maggiore desde o século XVII, quando o papa Clemente IX foi sepultado lá.
Sou um especialista em história litúrgica católica. Nos séculos anteriores, os funerais papais eram eventos elaborados, cerimônias condizentes com um príncipe renascentista ou outra figura real. Mas nos últimos anos, os ritos foram simplificados. Como o próprio Papa Francisco determinou, aqui estão as etapas que o ritual seguirá.
Primeira estação: Preparação do corpo
Os ritos fúnebres ocorrem em três partes, chamadas estações. A primeira ocorre na capela particular do papa, depois que os profissionais médicos certificam sua morte. Até recentemente, essa etapa ocorria ao lado do leito do papa.
Depois que o corpo repousa na capela, o cardeal que serve como camerlengo do papa – o chefe de gabinete do papa – fará os preparativos para o funeral. Ele também tem a tarefa de administrar o Vaticano até que um novo papa seja eleito. O atual camerlengo é o Cardeal Kevin Joseph Farrell, nomeado por Francisco em 2019.
Como tem sido feito há séculos, o camerlengo chamará formalmente o papa falecido pelo nome completo dado a ele quando foi batizado quando criança: Jorge Mario Bergoglio. Há narrativas ou lendas que afirmam que, nesse momento, o papa também foi batido três vezes na testa com um pequeno martelo de prata. No entanto, não há prova documentada de que isso tenha sido realmente feito nos séculos anteriores para verificar a morte de um papa.
Tradicionalmente, outro rito antigo também é realizado após a declaração da morte do papa: a desfiguração do anel do papa. Cada papa usa um anel feito sob medida com uma imagem gravada de um homem pescando em um barco, remetendo ao evangelho de Mateus, onde Jesus chama São Pedro de “pescador de homens”. Esse Fisherman’s Ring, com o nome do papa atual gravado sobre a imagem, poderia funcionar como um selo em documentos oficiais. O camerlengo quebrará o anel de Francisco e esmagará o selo com um martelo ou outro instrumento para impedir que qualquer outra pessoa o use.
Os apartamentos do papa também serão trancados. Tradicionalmente, isso era feito para evitar saques.
Segunda estação: Ver o corpo
O papa falecido será vestido com sua batina branca simples e vestes vermelhas e, em seguida, colocado em um caixão de madeira simples. Ele será levado em procissão até a Basílica de São Pedro, onde o velório público ocorrerá nos próximos três dias.
O corpo do papa será deixado no caixão simples e aberto durante esse período de velório a fim de enfatizar o papel humilde do papa como pastor e não como chefe de Estado. A prática anterior era colocar o corpo em cima de uma plataforma alta e elevada, chamada de catafalco; isso terminou com o funeral do Papa Bento XVI em 2022.
O Papa Bento XVI também foi o último papa a ser enterrado nos tradicionais três caixões de cipreste, chumbo e olmo. Dois caixões continham documentos específicos sobre seu pontificado; o primeiro caixão também continha os tradicionais três sacos de moedas – ouro, prata e cobre – representando cada ano de seu pontificado.
No funeral de Francisco, após o velório público, um pano branco simples será colocado sobre o rosto do papa enquanto ele estiver deitado no caixão de carvalho, uma parte constante dos funerais papais. Mas essa será a primeira vez que apenas um único caixão será usado; ele provavelmente conterá também um documento descrevendo seu pontificado e um saco de moedas de seu pontificado.
A missa fúnebre será celebrada na Basílica de São Pedro, provavelmente em seu interior devido ao clima do final do inverno, e provavelmente haverá uma multidão de fiéis do lado de fora, reunidos na praça. A homilia refletirá sobre a vida e a espiritualidade do papa falecido; Francisco ele mesmo pregou no funeral de seu antecessor aposentado, o papa Bento. E o futuro Papa Bento, como Cardeal Joseph Ratzinger, pregou no funeral do Papa São João Paulo II quando Ratzinger era o líder, ou o decano, de todas as autoridades sênior da igreja – o que é conhecido como Colégio de Cardeais.
O atual decano é o Cardeal Giovanni Battista Re, de 91 anos, e não está claro se ele poderá continuar essa tradição devido à sua idade avançada. As missas continuarão a ser rezadas em memória de Francisco por nove dias após sua morte – um período chamado Novendialis. Esse ritual foi inspirado em uma antiga tradição romana que prescreve um período de luto que termina no nono dia após uma morte.
Terceira estação: Enterro
No passado, os papas foram enterrados em vários lugares diferentes. Até a legalização do cristianismo no Império Romano no início do século IV, os papas eram enterrados nas catacumbas, os cemitérios nos arredores de Roma.
Posteriormente, os papas poderiam ser enterrados em vários locais diferentes, como a Basílica de São João de Latrão – a catedral oficial de Roma – ou outras igrejas em Roma e arredores. Alguns foram até mesmo enterrados na França durante o século XIV, quando o papado se mudou para a fronteira francesa por motivos políticos.
A maioria dos papas é sepultada nas grutas sob a Basílica de São Pedro e, desde o sepultamento do Papa Leão XIII em São João de Latrão em 1903, todos os papas foram sepultados na Basílica de São Pedro. De acordo com os desejos de Francisco, no entanto, provavelmente haverá uma procissão por Roma até Santa Maria Maggiore, incluindo o carro fúnebre e os carros que transportam outras pessoas que participarão desse ritual privado.
Após algumas orações finais e aspersão de água benta, o caixão será colocado em seu local final dentro da igreja. Somente mais tarde a área será aberta ao público para orações e veneração.
Depois de tantas viagens de Roma para visitar comunidades católicas em países de todo o mundo, e de tantas visitas a essa basílica para orações e meditação, parece apropriado que, no final da jornada de sua vida, Francisco faça uma última viagem à igreja que tanto amava para ser sepultado para sempre.
