Os insetos causam muito mais prejuízos do que simplesmente arruinar piqueniques. Alguns insetos espalham doenças devastadoras, enquanto outros causam perdas econômicas significativas na agricultura. Para controlar algumas dessas pragas, os cientistas estão desenvolvendo machos que tornam o sexo um evento mortal.
Os riscos são altos. Os mosquitos transmitem vírus como dengue, oeste do Nilo e Zika, bem como parasitas que causam malária. Pesquisadores estimam que os mosquitos causaram a morte de 52 bilhões de pessoas ao longo da história, quase metade de todos os seres humanos que já viveram.
Outros insetos causam grandes prejuízos às plantações, comprometendo o fornecimento de alimentos e elevando os preços. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), 20% a 40% da produção agrícola global é perdida anualmente para pragas, a um custo de US$ 70 bilhões.
Os pesticidas têm sido a linha de frente na defesa contra os insetos, mas muitos deles desenvolveram resistência a esses produtos químicos. Alguns pesticidas podem matar insetos benéficos indiscriminadamente, prejudicar o meio ambiente e colocar em risco a saúde humana e animal. Alguns cientistas temem que certos pesticidas possam causar câncer ou ter efeitos prejudiciais nos sistemas nervoso e endócrino humano.
Sou um pesquisador de microbiologia que estuda doenças infecciosas. Novas soluções para controlar insetos transmissores de doenças e pragas agrícolas que não prejudiquem os seres humanos e o meio ambiente podem fazer com que menos pessoas contraiam doenças perigosas. Nos últimos anos, várias abordagens de engenharia genética surgiram como estratégias promissoras para combater insetos problemáticos.
Insetos geneticamente modificados
Para evitar os problemas associados aos pesticidas, cientistas desenvolveram novas abordagens que alteram geneticamente os próprios insetos de forma a causar o colapso da população ou torná-los incapazes de transmitir doenças – uma estratégia chamada biocontrole genético.
A ideia de suprimir uma população de insetos inundando-a com machos estéreis existe há décadas. Desde a década de 1950, os cientistas têm usado radiação para criar mosquitos machos inférteis. Esses machos estéreis acasalam com as fêmeas, mas não produzem descendentes. Como as fêmeas estão envolvidas em um grande número de acasalamentos improdutivos, a população geral tende a diminuir.
Nas últimas duas décadas, a engenharia genética tem sido usada para introduzir genes letais dominantes em populações de insetos. Nessa abordagem, os descendentes de machos geneticamente modificados herdam um gene que os mata antes de atingirem a idade reprodutiva. Um teste de campo no Brasil constatou que essa estratégia reduziu a população de mosquitos alvo em até 95%. Outra abordagem no horizonte envolve a liberação de insetos geneticamente modificados para serem portadores pobres de patógenos que causam doenças.
Apesar desses avanços, uma das principais deficiências dos métodos atuais de biocontrole genético é que elas levam tempo para funcionar. Pelo menos uma geração precisa nascer antes do início da supressão da população. Isso significa que as fêmeas de insetos continuam a ser vetores de doenças ou pragas agrícolas até que tenham uma morte natural. Uma técnica ideal seria neutralizar as fêmeas imediatamente, especialmente durante surtos de doenças.
Uma abordagem mais rápida
Os biólogos Samuel Beach e Maciej Maselko da Universidade Macquarie, na Austrália, procuraram resolver esse dilema por meio da engenharia genética de insetos machos para produzir sêmen venenoso. O sêmen venenoso mataria a fêmea rapidamente, reduzindo a população mais rápido do que os métodos de biocontrole anteriores.
Para testar essa ideia, a equipe usou moscas-das-frutas chamadas Drosophila melanogaster, que são fáceis de modificar geneticamente e estudar em laboratório.
Os pesquisadores transferiram os genes do veneno da aranha errante brasileira (Phoneutria nigriventer) e da anêmona do mar Mediterrâneo (Anemonia sulcata) para os genomas das moscas-das-frutas.
A mosca geneticamente modificada produz e armazena proteínas de veneno em sua glândula acessória masculina, a próstata da mosca, juntamente com outras proteínas do fluido seminal. Após o acasalamento, a mosca deposita o sêmen venenoso no trato reprodutivo da fêmea. Os pesquisadores chamaram essa abordagem de técnica do macho tóxico.
Após o acasalamento, as toxinas seminais se infiltram no corpo da fêmea e atacam seu sistema nervoso central. As toxinas se ligam a proteínas chamadas canais iônicos nas membranas celulares que as células nervosas usam para se comunicar umas com as outras. Isso leva rapidamente à paralisia e à parada respiratória. Pode-se dizer que esses “Romeus” geneticamente modificados literalmente a deixam sem fôlego.
O tempo de vida das moscas fêmeas que se acasalaram com machos tóxicos diminuiu em até 64%. Uma simulação computadorizada da técnica do macho tóxico para o Aedes aegypti, um mosquito que transmite vários vírus, previu que essa abordagem poderia funcionar melhor do que os métodos atuais.
Segurança e eficácia
Embora promissora e inovadora, existem alguns desafios importantes que os pesquisadores que estão desenvolvendo a técnica do macho tóxico precisarão superar. Por exemplo, por enquanto só foi demonstrado que a técnica funciona em moscas-das-frutas. Se ela funcionará em mosquitos ou em outras pragas de insetos continua sendo uma questão em aberto.
Além disso, a técnica reduziu o tempo de vida da fêmea em apenas 37% a 64%. Para melhorar a taxa de mortalidade, os pesquisadores sugeriram que outras formulações de veneno poderiam funcionar melhor. Os pesquisadores poderiam experimentar milhares de genes de veneno de aranhas, cobras, escorpiões e centopeias. Cada novo veneno experimentado exigirá testes para garantir que os machos modificados os tolerem – se ficarem fracos, os machos não modificados poderão competir com eles pelas oportunidades de acasalamento.
Como acontece com todos os métodos de biocontrole genético, essa técnica pode ser muito cara para ser implementada em países de baixa renda. Os países precisariam financiar os custos de criação e implantação dos mosquitos com segurança.
Os insetos também polinizam as plantas e servem como fonte de alimento para outros animais, como os morcegos. Se esses insetos desaparecerem, o ecossistema poderá enfrentar efeitos adversos imprevistos. O monitoramento desses possíveis efeitos sobre o meio ambiente também será caro.
Outros pesquisadores estão fazendo experiências com o uso de toxinas de veneno para controlar parasitas que os insetos fêmeas espalham por meio da picada. Chamada de paratransgênese, essa técnica altera as bactérias intestinais de um inseto para produzir uma toxina que mata o parasita, deixando o inseto ileso. Como a população de insetos permanece inalterada, a paratransgênese pode representar um risco menor para os ecossistemas.
Os insetos tendem a se adaptar rapidamente aos métodos que os humanos usam para controlá-los. Portanto, é vantajoso ter várias estratégias à nossa disposição. A técnica do macho tóxico pode um dia se tornar uma nova e valiosa arma no arsenal para combater pragas de insetos.