Os oceanos do mundo abrigam uma variedade extraordinária de tubarões e raias, desde alguns dos maiores peixes do mar – como o majestoso tubarão-baleia e as raias-manta – até o luminescente, mas raramente visto, tubarão-lanterna-das-profundezas e os peixes-guitarra.
Os oceanos já foram repletos dessas espécies extraordinárias e antigas, que evoluíram há quase meio bilhão de anos. Mas o último meio século representou um dos maiores desafios à sua sobrevivência. A sobrepesca, a perda de habitat e o comércio internacional reduziram seus números, colocando muitas espécies em risco de extinção ainda em nossa geração.
Cientistas estimam que 100 milhões (sim, milhões) de tubarões e raias são mortos a cada ano para alimentação, óleo de fígado e outros fins comerciais.
O volume de perdas é devastadoramente insustentável. A pesca excessiva fez com que as populações oceânicas de tubarões e raias caíssem cerca de 70% globalmente desde a década de 1970.
É por isso que países de todo o mundo concordaram em dezembro de 2025 em adicionar mais de 70 espécies de tubarões e raias à lista de um tratado internacional sobre comércio de animais selvagens para proteção total ou parcial.
É uma medida importante que, como biólogo que estuda tubarões e raias, acredito que já deveria ter sido tomada há muito tempo.
Humanos colocam espécies em risco de extinção
Os tubarões têm passado por momentos difíceis desde a década de 1970, quando a sobrepesca, a perda de habitat e o comércio internacional de barbatanas, óleo e outras partes do corpo desses enigmáticos habitantes do mar começaram a afetar suas sensíveis populações. O filme “Tubarão”“, de 1975, e sua representação do grande tubarão branco como uma máquina de matar irracional não ajudou a melhorar sua percepção pelar pessoas.
Uma das razões pelas quais as populações de tubarões são tão vulneráveis à pesca excessiva e menos capazes de se recuperar é o atraso na maturidade sexual e o baixo número de descendentes. Se os tubarões e as raias não sobreviverem por tempo suficiente, a espécie não consegue reproduzir novos membros em número suficiente para permanecer estável.
A perda dessas espécies é um problema global porque elas são vitais para a saúde dos oceanos, em grande parte porque ajudam a controlar as populações de suas presas.
Listas de espécies ameaçadas e em risco de extinção, como a Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza, podem ajudar a chamar a atenção para os tubarões e raias que estão em perigo. Mas, como suas populações atravessam fronteiras internacionais, com rotas migratórias ao redor do mundo, os tubarões e raias precisam de proteção internacional, não apenas de esforços locais.
É por isso que os acordos comerciais internacionais estabelecidos pela Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, ou CITES na sigla em inglês, são vitais. A convenção tenta criar restrições globais que impeçam o comércio de espécies protegidas para lhes dar uma chance de sobreviver.
Novas proteções para tubarões e raias
No início de dezembro de 2025, a Conferência das Partes da CITES, composta por representantes de 184 países, votou para iniciar ou expandir a proteção contra o comércio de muitas espécies. As votações incluíram acrescentar mais de 70 espécies de tubarões e raias às listas da CITES para proteção total ou restrita.
As espécies recém-listadas ou atualizadas incluem algumas das mais carismáticas de tubarões e raias.
O tubarão-baleia, um dos únicos três tubarões que se alimentam por filtragem e o maior peixe do oceano, e as mantas e raias-diabo foram incluídos na lista que oferece as restrições mais rigorosas ao comércio, chamada “Apêndice I”. Os tubarões-baleia estão em risco devido à pesca excessiva e também por serem atingidos por navios. Como se alimentam na superfície, perseguindo a proliferação de zooplâncton, esses gigantes do oceano podem ser atingidos por navios, especialmente agora que esses animais são apontados como uma “atração turística imperdível”.
Os tubarões-baleia agora se juntam a esta lista mais restritiva com mamíferos mais conhecidos e fofinhos, como o panda gigante e a baleia azul, e receberão as mesmas proteções ao seu comércio internacional.
Os países membros da CITES concordam com os termos do tratado, portanto, são legalmente obrigados a implementar suas diretrizes para suspender o comércio. Para as restrições mais rígidas, de acordo com o Apêndice I, são necessárias licenças de importação e exportação, só concedidas em circunstâncias excepcionais. As espécies do Apêndice II, que ainda não estão ameaçadas, mas podem vir a estar sem proteções, exigem apenas as licenças de exportação. Mas os termos do tratado são essencialmente só uma estrutura para que cada governo membro implemente a legislação de acordo com suas leis nacionais.
Outro tubarão que se junta à lista do Apêndice I é o tubarão-de-ponta-branca, um elegante nômade oceânico de barbatanas longas que foi pescado até quase a extinção. As populações desse tubarão oceânico, outrora comum, diminuíram 80% a 95% no Pacífico desde meados da década de 1990, principalmente devido ao aumento da pesca comercial.
Anteriormente, os únicos tubarões ou raias listados no Apêndice I eram os peixes-serra, um grupo de raias com uma longa projeção semelhante a uma serra, rodeada por dentes afiados como punhais. Eles já estavam listados como criticamente ameaçados pela Lista Vermelha da IUCN, que avalia o status de espécies ameaçadas e em risco de extinção, mas cabia aos governos propor proteções por meio da CITES.
Outros tubarões que ganharam proteção parcial pela primeira vez incluem os tubarões-gulper de águas profundas, valorizados por seu óleo de fígado usado em cosméticos. As populações de tubarões-gulper foram dizimadas por práticas de pesca insustentáveis mas agora eles serão protegidos pelo Apêndice II.
As proteções sob o Apêndice II, embora não sejam tão fortes quanto as do Apêndice I, podem ajudar na recuperação das populações. As populações de tubarões brancos, por exemplo, se recuperaram desde a década de 1990 nos Estados Unidos depois de a espécie ser adicionada à lista do Apêndice II em 2005, embora outras populações no noroeste do Atlântico e no Pacífico Sul ainda sejam consideradas localmente ameaçadas de extinção.
O tubarão-cão-cinzento e o tubarão-smooth-hound também foram adicionados à lista do Apêndice II em 2025 para proteção contra o comércio de sua carne e barbatanas.
Várias espécies de peixes-guitarra e peixes-cunha, raias de formato estranho que parecem ter uma mistura de características de tubarões e raias e que foram prejudicadas pela pesca local e comercial, pela caça às barbatanas e pelo comércio, receberam a designação “cota zero” da CITES para restringir temporariamente todo o comércio das espécies até que suas populações se recuperem.
Essas proteções globais aumentam a conscientização sobre as espécies, impedem o comércio e a exploração excessiva e podem ajudar a evitar a extinção das espécies.
Espécies raramente vistas
Em todo mundo, existem hoje cerca de 550 espécies de tubarões e cerca de 600 espécies de raias (ou batoides), parentes dos tubarões com corpo achatado.
Muitas dessas espécies sofrem com o anonimato: a maioria das pessoas não está familiarizada com elas, e os esforços para proteger esses habitantes mais obscuros e menos fofinhos dos oceanos têm dificuldade em chamar a atenção.
Então, como convencer as pessoas a se importarem o suficiente para ajudar a proteger animais que elas nem sabem que existem? E podemos implementar proteções globais quando a maioria das interações entre tubarões e humanos é geograficamente limitada e muitas vezes sustenta a subsistência das comunidades locais?
Aumentar a conscientização sobre as espécies oceânicas em risco, incluindo o compartilhamento de conhecimento sobre por que seus números estão diminuindo e os papéis vitais que desempenham em seu ecossistema, pode ajudar.
As novas proteções para tubarões e raias sob a CITES também oferecem esperança de que mais regulamentações globais protegendo essas e outras espécies de tubarões e raias sejam implementadas.
