O esperado anúncio da tarifa de exportação de 50% por Donald Trump elevou em muito a tensão nas relações Brasil-EUA. Embora, pareça um assunto puramente econômico, em sua justificativa para taxar os produtos brasileiros, a Casa Branca assinalou um motivo de viés político, o julgamento do judiciário brasileiro do ex-presidente Bolsonaro por tentativa de violação do estado democrático de direito e tentativa de golpe de estado.
O terremoto americano produziu diversas reações no cenário político e econômico brasileiro. Por seu lado, o governo brasileiro explorou o acontecimento como uma violação de sua soberania e interferência indevida nos assuntos de outro país. Esse discurso conseguiu juntar setores de centro, empresarial, militares que não concordaram com a tarifa americana.
Já a oposição bolsonarista se fragmentou em razão da contraditória escolha de defender as exportações brasileiras ou apoiar as taxas de Trump em buscar de uma possível anistia. Nesse cenário, aspirantes ao cargo de presidente da República em estados fundamentais para a exportação (São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Goiás) entraram em rota de colisão com o núcleo forte dos Bolsonaros.
“Estamos em guerra: é tudo ou nada”
O que chamou a atenção nas últimas semanas é a atuação proativa do deputado federal licenciado, Eduardo Bolsonaro, em solo estadunidense. Ele utilizou do “lobby” e da proximidade com setores da extrema-direita americana para pressionar o governo americano a tomar medidas coercitivas contra o Brasil. Em relação a essa atuação, ele disse na última semana: “Estamos em guerra…é tudo ou nada”. Mas o que significa a tática do “tudo ou nada”?
Nos últimos anos, o crescimento da extrema-direita pelo mundo foi um fenômeno que chegou em vários países. Além de uma retórica conservadora em costumes e neoliberal em economia, esse movimento alcançou diversas vitórias eleitorais significativas em países como EUA, Brasil, Argentina, Itália, Hungria e Índia.
Embora num primeiro momento o discurso político pareça ilógico, existe uma estratégia e um método que envolve o uso das redes sociais em busca de um eleitorado descontente com os sistemas políticos atuais. É nesse espaço entre a raiva e a desilusão no sistema que os setores extremistas conseguem se tornar populares.
O discurso é que o mundo antigo era melhor, e o mundo atual foi invadido pela esquerda. Ela invadiu as instituições (estado, mídia, escolas) e maculou esses lugares. Dessa forma, na narrativa cabe a extrema-direita fazer uma guerra cultural (e real) para “recuperar” as instituições.
Uma extrema-direita conectada
As conexões internacionais da extrema-direita vão muito além de apenas um discurso político alinhado. Há diversos pontos de contato e reuniões periódicas que conectam esses grupos em uma rede muito forte. Por exemplo, a “Fundación Disenso”, articulada pelo líder do partido Vox na Espanha, Santiago Abascal, reúne uma rede de líderes de extrema-direita que se encontram anualmente para discutir como “combater o Foro de São Paulo, o comunismo e o grupo de Puebla na IberoAmérica”. O grupo conta com apoio de nomes da política nacional, como o ex-ministro de exteriores, Ernesto Araújo, e apoio político da família Bolsonaro.
No caso brasileiro, a família Bolsonaro conseguiu utilizar os métodos da extrema-direita americana para chegar ao poder em 2018. Durante o governo Bolsonaro foi comum a estratégia de dizer que eles lutavam contra o sistema. Muitas vezes, as falas tensionavam o ambiente político em busca de criar uma sensação de guerra. Assim, seus eleitores estavam aptos a lutar pela causa, fosse qual fossem os meios.
Nesse ambiente de tensão permanente é que foram articulados planos para manter o grupo extremista no poder. Assim, a constante retórica de questionar as eleições era parte da estratégia de preparar o terreno, caso Bolsonaro não ganhasse a disputa eleitoral em 2022 contra Lula.
O último tiro: Trump
A derrota eleitoral em 2022 foi precedida da arquitetura de um lento e gradual cenário de golpe de estado, aos moldes do que foi feito nos EUA em 6 de janeiro de 2021, quando apoiadores de Trump invadiram o Capitólio em busca de reverter a derrota eleitoral para Joe Biden. Porém, o 8 de janeiro de 2023 em Brasília não deu certo. Em seu lugar, a justiça brasileira iniciou uma investigação para chegar aos culpados da tentativa de rompimento do estado democrático de direito.
E a família Bolsonaro começou uma busca pela anistia aos envolvidos no 8 de janeiro. O insucesso da empreitada junto ao Congresso Nacional, fez com que eles articulassem uma última cartada no método de guerra: Trump. O envio de Eduardo Bolsonaro aos EUA foi uma tática para acelerar as sanções do seu aliado ao Brasil.
A estratégia envolve diversas ações para criar um cenário de guerra e instabilidade no Brasil:
-
Busca-se envolver os EUA em “lobby” com os setores da extrema-direita americana junto a Trump;
-
Utiliza-se os meios digitais para falar declarações tensas e que potencializem a guerra;
-
Cobra-se fidelidade dos grupos conservadores aliados a Bolsonaro, se não forem aliados, serão traidores da causa;
-
Personaliza-se a “culpa” do tarifaço para setores rivais: o presidente, o ministro do STF;
-
Mobiliza-se mídias conservadoras para divulgar a narrativa do “Tudo ou nada”;
-
Diz-se que a guerra é por princípios e valores (liberdade de expressão) e não por interesses materiais (liberdade de Bolsonaro).
Se a tática de guerra não conseguiu manter a extrema-direita brasileira no poder após 2022 por meio de eleições ou por meio de golpe de estado, a nova estratégia é usar países aliados no exterior para pressionar e desestabilizar o Brasil, inclusive alardeando que a Eleição de 2026 não será reconhecida pelos EUA ou que Lula não assumirá o poder em 2027. O lema não é mais “Brasil acima de tudo, e Deus acima de todos”, mas sim “Trump acima de tudo, e a liberdade de Bolsonaro acima de todos”.