Domingos da Cruz, na sua segunda edição do livro que conta com com análises críticas de diversos acadêmicos, aborda sobre os instrumentos de resistência civil para contextos autoritários
O filósofo, jornalista e escritor/académico angolano Domingos da Cruz[2] , um dos mentores do movimento 15+2, lançou uma nova edição crítica da obra Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura- Filosofia Política da Libertação para Angola[3] .O título, direto e provocador, sintetiza o propósito da obra que pretende fornecer instrumentos de resistência civil para contextos autoritários como os de Angola, Moçambique e outros países lusófonos em que “a ciência deve promover a dignidade humana”. E, num país como Angola, significa isso enfrentar a ditadura com soluções práticas”, afirma o autor em entrevista ao Global Voices. A obra revisita ideias já apresentadas na primeira edição publicada em 2025, agora enriquecidas por comentários de outros pensadores, num esforço coletivo para afinar estratégias de ação em contextos de opressão política, especificamente em países lusófonos vítimas de autoritarismo e acentuado fechamento do espaço cívico, como Moçambique.
Domingos parte da previsão de que “a realidade ditatorial angolana exige respostas concretas e que confiar em eleições organizadas por regimes autoritários é cair armadilha porque uma vez mais, a sociedade civil, descoberta que perante a ditadura, não possível será uma transição institucional no que tange, a uma eleição normal, tal como acontece, nas democracias e através dela, dar-se-á uma transição de transição de poder, o que se torna impossível, numa ditadura, e por isso, se tem de aplicar dois níveis desses instrumentos de formação necessários. Por um lado, refere Domingos que “dezenas de cidadãos de uma forma geral, que podem de forma singular participar no processo de luta não violenta com vista a colocar um termo a ditadura, por exemplo os cidadãos podem continuar a fazer a sua vida normal mas, ao mesmo tempo lutando para o fim da ditadura. encontra-se organizado, no sentido liberal da sociedade civil Mas um indivíduo que vai trabalhar consciente da situação que o país vive, pode desempenhar o seu papel no sentido de desafiar a ditadura e levar-la ao colapso. a hierarquia da segurança. Poder-se-ia olhar também, no setor de defesa no âmbito dos serviços secretos. Por exemplo, eles puderam fingir que cumpriram uma missão e apresentar relatórios falsos e os membros dos serviços secretos, dariam uma grande contribuição para o avanço do processo de luta, para quebrar a ditadura e consequentemente a construção de um movimento que poderia avançar com a democracia. Claro que esse, seria um nível geral em que as pessoas atuam e desempenham seu papel. As religiosas, um padre ou um pastor, na atividade religiosa, poderiam usar o tempo de culto para com a fundamentação teológica, esclarecendo à fé sobre o cativeiro da opressão em que o povo se encontra com autoridades. Poderiam comparar também, sobre o cativeiro em que o povo esteve controlado no Egito e que de acordo com a tradição profética, quando o povo se encontra no cativeiro é necessário lutar, para alcançar a liberdade”. relâmpago, numa segunda ou sexta-feira, desligam os carros e simplesmente vão à casa, criando um grande bloqueio ao nível do trânsito, fazendo com que aqueles que têm transporte privado não possam circular, criando um ambiente de tensão, para uma revolta popular, esse seria o nível mais geral da sociedade.
Por outro lado, há outro nível mais sofisticado que deve vir da sociedade civil ou dos partidos políticos da oposição, comprometidos com a transição para a democracia que não é exatamente o caso de Angola. No caso de Angola, colocaria todos os partidos de lado pois eles não representam uma solução revolucionária. Agora, dentro da sociedade civil talvez seja necessário que haja unidade da sociedade civil para que possa elaborar dois ou três grandes planos estratégicos, que seriam um conjunto de táticas para o ponto desencadear uma revolução popular.
À semelhança de Moçambique, a música de intervenção social pode ver o que Azagaia fazia em Moçambique. Mas, apresenta uma crítica a música que é feita hoje no contexto de Angola que infelizmente se encontra focada apenas nos sintomas da ditadura por abordar apenas, prisões arbitrárias, nível alto de pobreza, corrupção galopante, manipulação de controle da comunicação social, falta de serviços básicos de uma forma generalizada e isso constitui um erro. É necessário que se produzam músicas que digam claramente ao povo, que para que possamos livrar, esses todos os homens, é necessário desencadear uma revolução popular. Logo, isso seria um projeto coletivo em que as pessoas se juntassem à sua força para o alcance da democracia e derrubar a ditadura.
“O que há não são eleições, são simulações para legitimar o poder. Muitos acreditam que estão numa democracia, mas vivem numa ilusão”, afirma ele. Nas últimas eleições de 2022, a organização da sociedade civil, referiu que MUDEI [4] realizou um projecto interessante de monitoria eleitoral da qual chamaram de “projecto de monitoria eleitoral cidadã” e incorporaram ativistas de cidadãos de várias partes de Angola que deram a sua contribuição fazendo a contagem paralelamente dos resultados eleitorais e foram publicados, demonstrando uma grande disparidade entre os resultados oficiais e a contagem paralelamente, por um lado. Por outro lado, uma instituição de ensino angolana foi fazendo várias avaliações do monitoramento da imprensa porque a manipulação dos dados eleitorais não se faz apenas, na mexida da vontade expressa nas urnas no dia de votação, mas na forma como a imprensa é vencedora. O relatório do Instituto Sol Nascente no Huambo, demonstrou que houve um grande desequilíbrio na cobertura das eleições em Angola e na imprensa, deu mais atenção ao partido do regime que controla as instituições. Neste momento, segundo Domingos Da Cruz “não é possível falar de eleições livres, justas e transparentes”.
Da Cruz sublinha também, que essas ferramentas de resistência com protestos, boicotes e vigílias foram práticas em transições como a Tunísia durante a primavera Árabe em 2010 [5] e devem ser adaptadas e aplicadas em outras realidades da lusofonia. Em Moçambique, por exemplo, Domingos vê semelhanças claras com Angola e tem partilhado o livro com ativistas e académicos locais por conta de regimes autoritários de partidos po líticos como A FRELIMO e o MPLA que se dizem partidos irmãos.
Mais diálogo, mais consciência
Para Domingos, é urgente promover intercâmbios político-filosóficos mais profundos entre os países de língua portuguesa: “Infelizmente, esse diálogo ainda é fraco. Mas há sinais de crescimento na sociedade civil, como vimos na solidariedade durante a crise pós-eleitoral em Moçambique”. A vigilância constante, diz, é essencial para evitar o surgimento de novas ditaduras após uma transição política. Ele cita exemplos da Hungria, Turquia, Alemanha Nazista, para lembrar que nenhuma democracia está garantida.
“A liberdade não é definitiva. As democracias também caem. É preciso educar as novas gerações sobre isso e manter uma sociedade civil vigilante e ativa”, Domingos justifica que na verdade essas pedagogias e ou essas ferramentas são importantes e estão disponíveis. O exemplo disso é usar os meios de comunicação disponíveis pois, não se tem o controle dos meios tradicionais, mas, nas redes sociais usando as artes populares ou publicação de artigos podem ser usados como caminhos de consciencialização.
As redes sociais como espaço de mobilização
No contexto digital, Domingos confirma o papel crucial das plataformas sociais na mobilização cívica. “Não são suficientes por si só, mas são fundamentais para unir pessoas e transformar indignação em ação”. Moçambique [6] , mais uma vez, aparece como exemplo, especificamente com a eclosão da “crise pós-eleitoral em que as redes sociais foram garantidas para mobilizar e ações articuladas no terreno”, afirma Domingos.
Convite à ação
Mais do que um manifesto, a obra é um guia. Domingos espera que os leitores não apenas leiam, mas que se apropriem das ferramentas e as coloquem na prática de forma coletiva. “Não basta conhecer a receita. É preciso pôr a mão na massa. Só assim a liberdade será conquistada e defendida”.
[1] https://mudeiangola.org/actividades/fizemos/index.html
[2] https://www.bbc.com/portuguese/internacional-63602554
[3] https://aimnews.org/2025/04/09/manifestacoes-pos-eleitorais-causaram-um-prejuizo-superior-a-322-mil-milhoes-de-meticais-e-fizeram-50-mil-desempregados/
[4] Mais sobre o autor visite este link: https://www.wook.pt/autor/domingos-da-cruz/3802007?srsltid=AfmBOoqnuK- OpnwlhJqeRn8bJ3g_zoq7Vx3rlw1jtglz3Cp_azanVVwX
[5] Veja o lançamento do evento do livro no link que se segue: https://www.youtube.com/live/siz7xdLhZ6Q?si=gw1Hm2BoEzPlNRWX
[6] https://holdonangola.com/wp-content/uploads/2025/05/COMO-ACABAR-A-DITADURA.pdf